Considerações sobre o combate à violência contra as mulheres no Brasil e nos Estados Unidos

Autores

  • Raquel Branquinho ESMPU

Palavras-chave:

Violência, Política, Gênero, Raça, Brasil, EUA

Resumo

A baixa representatividade feminina nos espaços de poder no Brasil, principalmente nas diversas esferas do parlamento brasileiro, é uma realidade que tem demandado reflexões de vários grupos da sociedade civil e do próprio sistema de justiça. O Brasil ocupa as últimas posições nos marcadores mundiais de participação feminina na política, e a violência contra a mulher na sociedade brasileira, que perpassa os sistemas político e de justiça, tem sido considerada uma das principais causas desse cenário. Não obstante, existe uma legislação que vem sendo aprimorada, ao longo dos anos, a partir dos comandos do sistema universal e regional de direitos humanos, integrados pelo Brasil. Os Estados Unidos da América também enfrentam o mesmo problema em diferentes dimensões. No entanto, apesar da inexistência de uma legislação constitucional específica sobre a temática, o que é adequado ao sistema da common law, há uma maior representatividade feminina no parlamento federal desse país, notadamente na sua Câmara Federal. Esse fato deixa aquele país muito mais bem posicionado do que o Brasil tanto no que se refere ao gênero quanto às suas interseccionalidades. As eleições gerais ocorridas em 2020 naquele país demonstraram esse crescimento da participação plural feminina. Brasil e Estados Unidos da América, além de outras semelhanças relativas à dimensão territorial e populacional, possuem situações semelhantes quanto ao sistema democrático pautado em eleições periódicas, em igualdade de condições dos concorrentes. O modelo do sistema constitucional em ambos os países, no entanto, é bastante distinto. Se, por um lado, o Brasil possui uma hierarquia normativa bastante rígida, pautada numa Constituição analítica, os EUA conduzem o seu sistema federativo a partir dos precedentes judiciais que interpretam e aplicam o direito com base numa Carta Constitucional bastante sintética. O Brasil possui um sistema normativo consistente para materializar o direito da igualdade entre homens e mulheres, direito fundamental previsto na Carta Constitucional, já os EUA não possuem uma sistematização normativa sobre esse tema, e as decisões judiciais amparam-se nas poucas emendas constitucionais que disciplinam os direitos fundamentais dos cidadãos norte-americanos. No entanto, a comparação entre a representatividade feminina e a interseccionalidade do gênero, raça e outros marcadores na esfera política nesse país, principalmente em sua Câmara Federal, baseada no pleito eleitoral de 2020 e indicada pelo Inter-Parliamentary Union da ONU, demonstra a existência de uma maior e mais significativa participação das mulheres na vida política. Uma das hipóteses aventadas por este ensaio para responder a essa situação fática é a de que uma maior organização e consciência sobre direitos por parte da sociedade, sobretudo da sociedade civil organizada, pode conduzir a resultados mais consistentes do que a mera previsão normativa desses mesmos direitos, como acontece no Brasil, sem um maior engajamento e participação da sociedade.

Referências

ABADE, Denise Neves; FREITAS, Juliana Rodrigues. violência política de gênero no sistema internacional e no ordenamento interno: o estado constitucional cooperativo sob enfoque. Revista Direito Mackenzie, São Paulo, v. 17, n. 1, p. 1-31, 22 jun. 2023. ISSN 2317-2622. Disponível em: https://tinyurl.com/yfrsj6ru. Acesso em: 26 jul. 2024.

AUSTIN, Sharon. Congresso dos EUA terá recorde de mulheres – e 51 não são brancas. #Colabora, Rio de Janeiro, nov. 2020. Disponível em: https://tinyurl.com/mrxj3sch. Acesso em: 28 jul. 2024.

BELANDE, Caio; GOMES, Irene. Censo 2022: pela primeira vez, desde 1991, a maior parte da população do Brasil se declara parda. Agência IBGE Notícias, Rio de Janeiro, dez. 2023. Disponível em: https://tinyurl.com/y6duj8mp. Acesso em: 23 fev. 2024.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Casa Civil, Brasília-DF, [2016]. Disponível em: https://tinyurl.com/br265cmd . Acesso em: 23 fev. 2024.

BRASIL. Lei n. 14.192, de 4 de agosto de 2021. Estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher; e altera a Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965 (Código Eleitoral), a Lei n. 9.096, de 19 de setembro de 1995 (Lei dos Partidos Políticos), e a Lei n. 9.504, de 30 de setembro de 1997 (Lei das Eleições), para dispor sobre os crimes de divulgação de fato ou vídeo com conteúdo inverídico no período de campanha eleitoral, para criminalizar a violência política contra a mulher e para assegurar a participação de mulheres em debates eleitorais proporcionalmente ao número de candidatas às eleições proporcionais. Casa Civil, Brasília-DF, 2021. Disponível em: https://tinyurl.com/yz34mh5j . Acesso em: 17 fev. 2024.

BRASIL. Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965. Institui o Código Eleitoral. Casa Civil, Brasília-DF, 1965. Disponível em: https://tinyurl.com/3rajsz7b . Acesso em: 23 fev. 2024.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral – TSE. Resolução n. 23.405, de 27 de fevereiro de 2014. Dispõe sobre a escolha e o registro de candidatos nas Eleições de 2014. Casa Civil, Brasília-DF, 2014. Disponível em: https://tinyurl.com/ayepcca7 . Acesso em: 19 ago. 2023.

BUTLER, Judith. Quem tem medo do gênero? Tradução: Heci Regina Candiani. São Paulo: Boitempo, 2024. [Título original: Who is afraid of gender?]

CÂMARA DOS DEPUTADOS. A Conquista do voto feminino. Agência Câmara de Notícias, Brasília-DF, 15 fev. 2021. Disponível em: https://tinyurl.com/3hjzxwde. Acesso em: 29 jul. 2024.

CARDOSO, Rafael. Censo 2022: mulheres são maioria em todas as regiões pela primeira vez. Agência Brasil, Rio de Janeiro, 27 out. 2023. Direitos Humanos. Disponível em: https://tinyurl.com/3ddse9yx . Acesso em: 17 fev. 2024.

CARVALHO RAMOS, André. Processo Internacional de Direitos Humanos. 7. ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2022.

CARVALHO RAMOS, André. Supremo Tribunal Federal brasileiro e o controle de convencionalidade: levando a sério os tratados de direitos humanos. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, v. 104, p. 241-286, jan./dez. 2009. Disponível em: https://tinyurl.com/3usjn2c6. Acesso em: 17 fev. 2024.

CERQUEIRA, Daniel; BUENO, Samira (coord.). Atlas da Violência 2024. Brasília: Ipea; FBSP, 2024. Disponível em: https://tinyurl.com/3jwkawd8. Acesso em: 17 fev. 2024.

COSTA, Alice Alcantara Ana; SARDENBERG, Cecília Maria B. Feminismo do Brasil: reflexões teóricas (org.). Salvador: UFBA/Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher, 2008. 411p. Disponível em: https://tinyurl.com/3dhm8m2j. Acesso em: 22 nov. 2024.

ESCRITÓRIO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE DROGAS E CRIMES – UNODC. Global Study on Homicide 2023. Viena: United Nations, 2023. Disponível em: https://tinyurl.com/vfzj33ac. Acesso em: 17 fev. 2024.

FEIJÓ, Alexsandro Rahbani Aragão. A Constituição brasileira de 1891 e o federalismo norte-americano. Publica Direito, São Paulo, 2012. Disponível em: https://tinyurl.com/2ct6wwm8. Acesso em: 23 fev. 2024.

FORMIGA, Giceli Carvalho Batista; FELDENS, Dinamara Garcia; ARDITTI, Roberta Gusmão. Feminismos interseccionais: problematizando o sujeito do feminismo. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 28, p. e280086, 2023. DOI: https://doi.org/10.1590/S1413-24782023280086 .

FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA – FBSP. 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. São Paulo: Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2024. Disponível em: https://tinyurl.com/msp77snb. Acesso em: 17 fev. 2024.

FREIRE, Alonso; BECKER, Rodrigo Frantz. Introdução à Suprema Corte dos Estados Unidos. In: BECKER, Rodrigo Frantz (coord.). Suprema Corte dos Estados Unidos: casos históricos. São Paulo: Almedina, 2022. (Coleção IDP).

GARCIA, Letícia Giovanini. Mulheres, política e direitos políticos: atualizada de acordo com a EC 117/22 (Aplicação de recursos do Fundo Partidário e Promoção e Difusão da Participação Política das Mulheres) e Leis n. 14.192/2021 e 14.197/2021 (Crime de Violência Política de Gênero). São Paulo: Almedina, 2023.

LOPES, Twig Santos. Violência política contra as mulheres. Rio de Janeiro: Ed. Mórula, 2024.

MP ELEITORAL – MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL. Breves considerações sobre as alterações estatutárias dos partidos políticos para cumprir a determinação da Lei n. 14.192/2021 e Recomendação da Procuradoria-Geral Eleitoral. Casa Civil, Brasília-DF, 2022. Disponível em: https://tinyurl.com/wwc28ft3 . Acesso em: 19 ago. 2023.

OLIVEIRA, Gabrielly. Mulheres e políticas nos Estados Unidos: a luta pela aprovação da Equal Rights Amendment. 2017. 21 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Relações Internacionais) – Universidade Federal de Uberlândia, Minas Gerais, 2017. Disponível em: https://tinyurl.com/yrpe92e2 .

OLIVEIRA, Neide M. C. Cardoso. NASCIMENTO, Raquel Branquinho Mamede. Violência Política de Gênero na Disciplina da Lei 14.192/2021. In: VALVERDE, Kátia Junqueira (coord.). Delineando o Direito: a visão jurídica sob o olhar das mulheres. Rio de Janeiro: Synergia Editora, 2023. p. 511.

ONU BRASIL – ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS BRASIL. Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Nações Unidas Brasil, Brasília, 15 set. 2015. Disponível em: https://tinyurl.com/29ffzmvr. Acesso em: 5 ago. 2024.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – ONU. Cartilha de Prevenção à Violência Política contra as Mulheres em Contextos Eleitorais. ONU Mulheres, Brasília, 2021. Disponível em: https://tinyurl.com/24whank3. Acesso em: 23 fev. 2024.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS – ONU. Women in Politics 2023. Portal IPU, Genebra, mar. 2023. Disponível em: https://tinyurl.com/yen6xw63. Acesso em: 17 fev. 2024.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS MULHERES – ONU MULHERES; GÊNERO E NÚMERO – GN. Prevenção e enfrentamento da violência política contra as mulheres: experiências e boas-práticas na América Latina. #Violência não: pelos direitos políticos das mulheres. Newsletter n. 3. ONU Mulheres, Brasília, jun. 2021. Disponível em: https://tinyurl.com/3xsrxba4. Acesso em: 4 ago. 2024.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS MULHERES – ONU MULHERES; PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO – PNUD. Prevenir a violência contra as mulheres durante as eleições: um guia programático. ONU Mulheres, Brasília, 2020. Disponível em: https://tinyurl.com/yjaau56p. Acesso em: 2 ago. 2024.

ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS – OEA. Comissão Interamericana de Mulheres. Protocolo Modelo para Partidos Políticos: prevenir, atender, punir e erradicar a violência contra as mulheres na vida política. OEA, Washington-D.C, 2019. Disponível em: https://tinyurl.com/2p9w628u. Acesso em: 26 jul. 2024.

ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS – OEA. Ley Modelo Interamericana para prevenir, sancionar y erradicar la violencia contra las mujeres en la vida política. OEA, Washington-D.C., 2017. Disponível em: https://tinyurl.com/mrxwv3hm . Acesso em: 26 jul. 2024.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE – OMS. OMS: uma em cada 3 mulheres em todo o mundo sofre violência. Nações Unidas Brasil, Brasília, 10 mar. 2021. Disponível em: https://tinyurl.com/3ebu6key. Acesso em: 27 jul. 2024.

PEREIRA, Giulia. Há 100 anos, sufragistas americanas conquistavam direito ao voto feminino. CNN Brasil, São Paulo, 18 ago. 2020. Disponível em: https://tinyurl.com/2v5skn86 . Acesso em: 29 jul. 2024.

PEREIRA, Nathália Mariel Ferreira de Souza. Romer v. Evans, 1996. Minimalismo Judicial: Equal Protection Doctrine e Discriminação por Gênero. In: BECKER, Rodrigo Frantz (coord.). Suprema Corte dos Estados Unidos: casos históricos. São Paulo: Almedina, 2022. (Coleção IDP).

PORTELA JR., Aristeu; LIRA, Bruno Ferreira Freire Andrade. Améfrica Ladina e a crítica à democracia racial em Lélia de Almeida Gonzalez. Horizonte Antropologia, Porto Alegre, ano 28, n. 63, p. 105-131, maio/ago. 2022. Disponível em: https://tinyurl.com/5t5da3h4. Acesso em: 29 jul. 2024.

RIBEIRO, Nádia Junqueira; BRESSIANI, Nathalie. Nancy Frasier: “O neoliberalismo não se legitima mais”. Le Monde Diplomatique Brasil, São Paulo, 26 mar. 2020. Disponível em: https://tinyurl.com/tscf3xc8. Acesso em: 29 jul. 2024.

SÃO PAULO. Tribunal Regional Eleitoral – SP. Principais fontes para financiar campanhas, fundos eleitoral e partidário têm regras distintas. TRE, São Paulo, 29 maio 2023. 16:56. Disponível em: https://tinyurl.com/3tbf49u9. Acesso em: 12 jul. 2024.

SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil para análise histórica. Tradução de: Christine Rufino Dabat e Maria Betânia Ávila. Nova York: Columbia University Press, 1989. Disponível em: https://tinyurl.com/b25fwmrk. Acesso em: 12 jul. 2024. [Título original: Gender: a useful category of historical analyses. Gender and the politics of history].

TRANSPARÊNCIA BRASIL. Nota técnica assinada por organizações lista 9 pontos críticos da PEC da anistia a partidos. Transparência Brasil, 11 jul. 2024. Disponível em: https://tinyurl.com/5a7esv7c. Acesso em: 27 jul. 2024.

Downloads

Publicado

11.12.2024

Como Citar

Branquinho, R. (2024). Considerações sobre o combate à violência contra as mulheres no Brasil e nos Estados Unidos. Revista Da Escola Superior Do Ministério Público Da União, 2(1), e-2106. Recuperado de https://escola.mpu.mp.br/publicacoescientificas/index.php/revista2/article/view/812

Edição

Seção

Dossiê Temático