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Paraibanos discutem desafios da integração de migrantes e refugiados no Estado
Agentes públicos, sociedade civil, acadêmicos e migrantes estiveram reunidos em João Pessoa, entre os dias 10 e 12 de abril, para discutir os acertos e os desafios no acolhimento e na integração dos migrantes e refugiados na Paraíba. As atividades – um simpósio e sete oficinas – aconteceram na sede do Ministério Público Federal na capital da Paraíba e foram realizadas pela Rede de Capacitação a Refugiados e Migrantes.
O fluxo migratório no Estado antes existente, mas considerado invisível, segundo Maritza Farena, coordenadora do Grupo de Trabalho Migrações e Direitos Humanos da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), ganhou notoriedade com a chegada dos venezuelanos em 2018. Estima-se que, desde o início da crise na Venezuela, aproximadamente 350 cidadãos venezuelanos migraram para a Paraíba. De acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), 244 deles chegaram ao Estado por meio do projeto de interiorização, coordenado pelo Governo Federal. Os demais, de acordo com Maritza, escolheram João Pessoa e outros municípios paraibanos por iniciativa própria ou para reencontrar familiares que deixaram a Venezuela há mais tempo.
Simpósio - O Município de Conde, na região metropolitana de João Pessoa, recebeu parte dos venezuelanos e venezuelanas, ainda em meados de 2018. Foram 45 migrantes, de acordo com a prefeita, Márcia Lucena. Ela participou do Simpósio “Migrante e Refugiados na Paraíba: Como Acolher e Integrar?” e contou a experiência local, destacando a importância da atuação do poder executivo nas ações de acolhimento e integração dos venezuelanos. De acordo com a chefe do poder executivo, no processo de integração há o envolvimento de muitas pessoas, mas a vontade política e a institucionalização das medidas pelo Município são necessárias para que as ações adequadas sejam efetivadas.
Conde é, reconhecidamente, uma das melhores experiências no acolhimento e integração de migrantes venezuelanos entre os Municípios brasileiros que participaram do projeto de interiorização. A prefeita ainda atribuiu o sucesso do trabalho à ação coordenada que envolveu o Serviço Pastoral dos Migrantes do Nordeste, as secretarias municipais de saúde, educação e desenvolvimento social, o Ministério Público e os moradores.
Outro destaque no simpósio foi a necessidade de conscientizar a população em relação ao tema da migração. Diante do questionamento do público de uma eventual priorização do atendimento aos migrantes em detrimento do atendimento aos brasileiros pelo poder público, o procurador regional dos Direitos do Cidadão na Paraíba (PRDC/MPF), José Godoy Bezerra de Souza, explicou que os equipamentos públicos, como hospitais, escolas e serviços de assistência não são impactados de maneira significativa se há um processo de interiorização bem feito. De acordo com Godoy, não há disputa entre brasileiros e migrantes e “é preciso entender que as vagas que estão sendo ocupadas já estavam disponíveis”. “Se a presença deles sufocar uma política, é porque o serviço precisa ser ampliado”, reforçou Godoy.
João Akira Omoto, diretor-geral da Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU), explicou que o questionamento tem um fundo discriminatório, pois busca estabelecer uma distinção entre o brasileiro e o estrangeiro residente no Brasil, e que dignidade não pode ser contada em números. Na mesma linha, Andrea Pacheco Pacífico, integrante da Cátedra Sérgio Vieira de Mello e professora da Universidade Estadual da Paraíba, defendeu que os migrantes e refugiados, além de não usurparem nenhum direito do brasileiro, podem ainda contribuir enormemente para o desenvolvimento econômico da localidade.
Ainda durante o simpósio a venezuelana Aiza Mercedes Natera Flores, engenheira mecânica de 53 anos, contou sua história de migração para o Brasil. Segundo Aiza, a Venezuela em crise econômica grave não permitia que, nem com dois empregos, pudesse comprar itens básicos para a família. Ela explicou que pegou um mês de férias para vir ao Brasil com o filho “ver como era” e ao chegar na fronteira se deparou com “muita pobreza, pessoas com fome, dormindo no chão”. Em Boa Vista, apesar de ser bem recebida, Aiza e seu filho encontraram muitas dificuldades no pedido de abrigo e na solicitação de documentos. Após resolvidos todos trâmites legais, seu filho retornou à Venezuela para buscar a irmã doente, a esposa e a filha. Quando retornou a Boa Vista, a família pediu para ser interiorizada.
Atualmente, Aiza vende bolos, pois, segundo ela, é difícil conseguir um emprego como engenheira. Ela contou, emocionada, que pediu a Deus um lugar bonito, onde ela pudesse viver e, assim, chegou à João Pessoa, e já tem, inclusive, uma neta brasileira.
Ainda estiveram presentes no simpósio, o procurador-chefe substituto do Ministério Público Federal na Paraíba, Sérgio Rodrigo Pimentel de Castro Pinto; o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho na Paraíba, Carlos Eduardo de Azevedo Lima; o defensor público-chefe da União na Paraíba, Edson Júlio de Andrade Filho; a secretária estadual de desenvolvimento humano do Estado da Paraíba, Neide Nunes da Silva; o representante da UNICEF, Dennis Larsen; o primeiro secretário do escritório do Itamaraty no Nordeste, Hugo Lorenzetti; o defensor público da União, Gustavo Zortea; a consultora da ESMPU, Cynthia Sampaio; a secretaria municipal de saúde de João Pessoa, Ana Giovanna; e os representantes do Serviço Pastoral dos Migrantes e da Aldeias Infantis SOS, José Roberto Saraiva dos Santos e Alzineide Barbosa.
Acesse as fotos do simpósio.
Oficinas – As oficinas em João Pessoa reuniram mais de 100 pessoas para discutir, com mais profundidade, temas como Nova Lei de Migração, Lei de Refúgio, Direitos e Acesso à Justiça, Integração Local, Direitos Laborais, Migração e Prevenção ao Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas, Gestão Migratória em Nível Local e Gênero, Direitos Humanos, Migração e Rede de Proteção. As atividades também tiveram como objetivo fomentar a articulação dos atores que atuam no acolhimento e integração dos migrantes a partir da definição clara, tirada durante as oficinas, de ações que podem ser implementadas.
O educador social Sérgio Silva, da organização não-governamental Aldeias Infantis SOS Brasil, em João Pessoa, avaliou que as capacitações permitiram conhecer de forma mais precisa o caminho que o migrante percorreu até sua chegada à Paraíba. Ele explicou que as atividades fizeram um panorama do processo de interiorização e, posteriormente, será mais fácil para os atores que trabalham no acolhimento e na integração compreenderem todos os tipos de demanda dos migrantes.
O depoimento da venezuelana Aiza Mercedes durante o simpósio foi o ponto máximo dos três dias de atividade, de acordo com a advogada Tereza Aline de Almeida Ramalho Brunei, membra da Comissão de Direitos Humanos e Direito Internacional da Ordem dos Advogados do Brasil na Paraíba (OAB/PB). Ela explicou que os relatos de Aiza permitiram conhecer a realidade do migrante, sem filtros da mídia ou de interlocutores. Tereza também enalteceu o evento que, em sua visão, formou multiplicadores de conhecimento que poderão partilhar as ideias e os conteúdos apresentados durantes as atividades. “Eu vejo que inicialmente pode não surtir tanto efeito, será uma caminhada a médio e longo prazos. Mas toda caminhada começa com um primeiro passo e esse evento foi desses primeiros passos”, finalizou a advogada.
Acesse as fotos das oficinas.
Veja o material utilizado e produzido nas atividades.
Rede de Capacitação - A Rede de Capacitação a Refugiados e Migrantes, composta pela ESMPU, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), o Ministério Público do Trabalho (MPT), o ACNUR, a Organização Internacional para as Migrações (OIM), a Conectas Direitos Humanos, o Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH), a Defensoria Pública da União (DPU), o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), a Missão Paz e o UNICEF já realizou as atividades de capacitação em outras seis capitais (Belém, Manaus, São Paulo, Boa Vista, Porto Alegre e Recife) e já capacitou cerca de 1.500 pessoas.
Para a realização das atividades em João Pessoa, a Rede contou com a parceria do Ministério Público Federal na Paraíba, do Ministério Público do Trabalho na Paraíba, da Defensoria Pública da União na Paraíba, de instituições públicas locais e de organizações não governamentais locais envolvidas no processo de atenção ao refugiado ou migrante.
Saiba mais sobre o projeto em http://escola.mpu.mp.br/h/rede.
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