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Seminário discute repercussões jurídicas, políticas e sociais dos eventos climáticos no Rio Grande do Sul

Encontro teve início nesta segunda-feira (26/8) na sede da ESMPU, em Brasília, e contou com a participação de membros do Ministério Público e renomados especialistas em mudanças climáticas
publicado: 26/08/2024 21h26 última modificação: 28/08/2024 15h09
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Foto: Divulgação/ESMPU

Com o objetivo de discutir como mitigar novas tragédias ambientais e assegurar que o Poder Público e a sociedade civil adotem providências no enfrentamento de eventos extremos relacionados ao clima, a Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU) promove o seminário “Emergência climática: repercussões jurídicas, políticas e sociais dos eventos extremos no Rio Grande do Sul”. O encontro, em parceria com a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e o Instituto Clima e Sociedade (iCS), teve início nesta segunda-feira (26/8), com transmissão pelo canal da ESMPU no YouTube, e contou com a participação de membros do Ministério Público, autoridades de órgãos federais, cientistas e especialistas em mudanças climáticas. Clique para assistir.

Abertura – Na abertura do seminário, a diretora-geral da ESMPU, Raquel Branquinho, ressaltou a urgência de um esforço estratégico coordenado entre as esferas públicas para mitigar problemas climáticos atuais – como as secas intensas e os graves incêndios que impactam ecossistemas brasileiros – e prevenir novos casos. “Hoje vivenciamos o resultado de práticas políticas, sociais e culturais que vêm se arraigando ao longo dos últimos 30 anos de forma bem clara e definida. É importante tentar reduzir a ocorrência de situações graves, considerando os estudos acadêmicos e científicos vigentes, e trabalhando em conjunto com o sistema de Justiça”, ponderou.

Caio de Souza Borges, diretor regional da File Foundation para América Latina e Caribe, enfatizou os principais desafios jurídicos sobre os desastres climáticos, uma vez que o Direito ainda está aprendendo a dar respostas e soluções para tais questões. “A crise climática atinge a todos; porém, de maneira mais gravosa, as comunidades vulneráveis. Um desastre de grande magnitude, como aconteceu no Rio Grande do Sul, põe diante do Estado Democrático de Direito uma série de desafios para garantir que aqueles que menos causaram problemas – mas que mais sofrem os impactos – terão algum tipo de prioridade e serão de fato reparados.”

Para a procuradora-chefe da Procuradoria Nacional de Defesa do Clima e do Meio Ambiente, Mariana Barbosa Cirne, a Advocacia-Geral da União (AGU) vem adotando uma nova postura para tornar mais efetiva a política pública do governo federal a respeito do clima. "Entre as ações, estão a inclusão da juventude nos debates, a realização de parcerias, o reconhecimento de pedidos climáticos e as novas construções de políticas públicas climáticas de prevenção e mitigação de danos", destacou.

A subprocuradora-geral da República e coordenadora da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal (4CCR/MPF), Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, falou sobre a urgência de se criar e gerir políticas públicas de prevenção, mitigação e adaptação diante do cenário climático atual em várias regiões do Brasil. “Não se trata de mudanças, mas de emergências climáticas que exigem uma atuação integrada das instituições que trabalham com o Direito Ambiental. Temos um arcabouço legal, mas prevenir ou dar soluções para esses problemas climáticos vai muito além do Direito”, frisou.

Para o procurador regional da República e presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Ubiratan Cazetta, é preciso olhar para o hoje, diante de uma condição climática inesperada, para promover uma discussão que não pode ser meramente teórica. “Estamos diante de desafios imensos. Temos uma cultura sobre questões ambientais, mas não podemos correr o risco de que essas questões sejam tratadas de forma retórica; assim, devemos trazer esse discurso para a prática da construção efetiva.”

Primeiro painel – A cientista e doutora em Estatística Espacial pela Universidade de Sheffield Thelma Krug abriu o primeiro painel do seminário com o tema “Emergência climática: panorama científico, desafios dos poderes públicos”. Krug trouxe dados estatísticos atuais e projeções – coletados de múltiplas fontes independentes – a respeito das mudanças climáticas extremas, como o aquecimento global, considerando as causas naturais e os efeitos antrópicos.

Para a pesquisadora, fatores como maior concentração de gás carbônico na atmosfera, elevação do nível do mar e retração das geleiras combinam diversos elementos que resultam em calor extremo, fortes chuvas e secas intensas. Para ela, é preciso tratar os problemas regionais de forma diferenciada e não generalista. “Além disso, devemos repensar práticas que incluem sociedade civil, comunidades vulneráveis, instituições públicas e empresas privadas para a construção efetiva de um processo de adaptação climática.”

O pesquisador associado do Instituto Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) Carlos Souza Junior chamou a atenção para os estudos realizados na Região Norte do Brasil e os impactos das mudanças climáticas nas comunidades ribeirinhas. “De acordo com uma avaliação sobre a seca no bioma amazônico realizada em 2023, identificamos uma perda de 3,3 milhões de hectares de superfície de água, o que acabou isolando muitos povos originários e comunidades ribeirinhas. Até mesmo áreas consideradas protegidas – longe do desmatamento, das mudanças climáticas e da pressão antrópica – foram afetadas.”

Já o cientista e doutor em Meteorologia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) Carlos Afonso Nobre analisou os diversos fatores que culminaram na tragédia climática do Rio Grande do Sul. “O impacto foi caracterizado por uma combinação de eventos extremos de chuva com implicações generalizadas. A tragédia climática no Rio Grande do Sul pode representar perdas de R$ 58 bilhões para o próprio estado e de R$ 38 bilhões para outras unidades da federação, com um impacto de cerca de R$ 97 bilhões na economia brasileira no ano de 2024.”

Nobre citou o desafio da descarbonização e o alcance do chamado net zero, em que o saldo das emissões e das remoções de carbono soma zero, ou seja, deve ser neutro. “Os planos devem apresentar metas intermediárias e sustentáveis, políticas alinhadas, rastreabilidade e mecanismo de governança com transparência. Além disso, o esforço local deve estar alinhado com a metas do Acordo de Paris de manter o aquecimento global abaixo de 1,5 °C. Ou seja, um enorme desafio para a humanidade”, concluiu.

Segundo painel ­– O professor e doutor em Física Atmosférica pela Universidade de São Paulo (USP) Paulo Eduardo Artaxo Netto abriu o segundo painel discutindo a solidez apresentada pela Ciência das Mudanças Climáticas, que estuda as causas e os efeitos desse fenômeno. “Eventos climáticos extremos sempre ocorreram no passado e vão continuar presentes no futuro. O que acontece é que nós estamos acelerando a frequência e a intensidade desses eventos. Um dos maiores dilemas que enfrentamos hoje é a perda de conexão vital entre os seres humanos e o resto do mundo que nos sustenta, uma vez que a humanidade se tornou força dominante na formação da Terra”, refletiu.

Ana Amélia Campos Toni, secretária de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e doutora em Ciência Política pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), abordou de forma provocativa os impactos dos eventos extremos no país. “Participar do debate internacional é importante, mas precisamos fazer nosso dever de casa. Somos um país altamente vulnerável, pois a energia e as safras dependem de água, e os efeitos das mudanças climáticas já estão espalhados pelo Brasil. Do total de 5.570 municípios brasileiros, 3.670 apresentam baixa capacidade de adaptação aos eventos extremos; ou seja, estamos mal preparados”, enfatizou. 

A advogada e mestre em Direito Ambiental pela University College London Caroline Dihl Prolo encerrou o segundo painel analisando as políticas públicas  para adaptação aos eventos climáticos extremos. “Nem tudo que é uma falha de adaptação vai gerar um desastre climático, mas precisamos de cidades adaptadas para sobreviver à crise climática. Por isso, é preciso haver uma política de adaptação com a inclusão de gestão de risco climático”, finalizou.

A programação do seminário se estende nesta terça-feira (27/8). Estão previstos mais dois painéis com temas envolvendo ações de mitigação de danos previsíveis e responsabilidade dos poderes públicos; e a compensação e a reparação diante da dimensão ambiental e social dos danos climáticos. O evento será transmitido pelo canal da ESMPU no YouTube em link disponível aqui

Exposição fotográfica - O público da ESMPU pôde conferir, ainda, a exposição "As enchentes do Rio Grande do Sul - 1941 x 2024". A mostra retrata alguns registros das inundações que o estado gaúcho sofreu nos de 1941 e 2024, fazendo um contraponto entre passado e presente. As fotografias são do fotógrafo Jorge Guerino Lansarin e do acervo do Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo. A exposição está aberta ao público no Espaço Cultural da ESMPU, até 20 de setembro, de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h.

Confira as fotos do primeiro dia

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