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Procuradoras do Trabalho debatem reflexos da pandemia nas relações de trabalho

Webinar abordou aspectos como discriminação, negociação coletiva, proteção ao trabalho portuário e aquaviário e meio ambiente laboral sadio
publicado: 10/07/2020 16h22 última modificação: 10/07/2020 16h35
Fotos das painelistas

Fotos das painelistas

A Escola Superior do Ministério Público do União (ESMPU) promoveu, na manhã desta sexta-feira (10/7), um debate entre sete mulheres da carreira do Ministério Público do Trabalho (MPT), que examinaram os reflexos da pandemia de Covid-19 nas relações de trabalho. Mediado pelo diretor-adjunto da ESMPU, o subprocurador-geral do Trabalho Manoel Jorge e Silva Neto, o Seminário virtual “O MPT e a tutela trabalhista em tempos de pandemia" foi transmitido pelo canal da instituição no YouTube. Clique aqui para assistir na íntegra ao webinar. 

Durante a atividade, foram realizados quatro painéis que abordaram aspectos como discriminação nas relações de trabalho, negociação coletiva, proteção ao trabalho portuário e aquaviário e meio ambiente sadio no trabalho. 

Discriminação nas relações de trabalho – O primeiro painel tratou da discriminação nas relações de trabalho. Ao abrir o debate, a procuradora regional do Trabalho Lutiana Nacur Lorentz fez uma retrospectiva histórica e, resumidamente, categorizou quatro grandes fases no tratamento de pessoas com deficiência: a da eugenia ou da eliminação propriamente dita; a da Era Cristã, com o tratamento assistencialista; a da integração, vinda com o Renascimento, na qual as pessoas com deficiência deveriam ser consertadas para poderem conviver em sociedade; e, por fim, a teoria da inclusão, na qual se busca uma sociedade para todos. “Essas quatro fases não são estanques, mas, sim, sujeitas a retrocessos e avanços ao longo da História. Não existe nenhum direito definitivamente conquistado. É preciso sempre estar na luta para manter direitos e conquistar outros. Direito é luta”, ressaltou. 

No Brasil, a fase da inclusão possui como marcos legais a Constituição Federal de 1988 e a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), ratificada pelo país em 2009. Segundo Lorentz, esses dois normativos mudaram o conceito de pessoa com deficiência, que passou a ser entendida como aquela que tem um impedimento de longo alcance, que, aliado a barreiras, pode obstruir a participação dela na sociedade. A procuradora regional do Trabalho fechou sua participação comentando a medida positiva, trazida pela recente Lei n. 14.020, de 6 de julho de 2020, que proíbe, durante a pandemia, a dispensa sem justa causa do empregado pessoa com deficiência (art. 17, inciso V). 

Ainda sobre a temática, a procuradora do Trabalho Valdirene Silva de Assis abordou questões relativas a gênero e raça e defendeu como essenciais as normas de proteção ao trabalho das mulheres. Para ela, assim como no tratamento de pessoas com deficiência, a equidade de gênero no mundo do trabalho passa por ações afirmativas e medidas protetivas que reconheçam as especificidades da realidade feminina e o contexto de imposições sociais históricas. “Neste momento de pandemia, as mulheres trabalhadoras se encontram numa situação de maior vulnerabilidade, com dados mostrando o aumento da violência doméstica e da sobrecarga de trabalho”, contextualizou. 

Segundo Valdirene de Assis, entender o conjunto normativo que diz respeito ao trabalho da mulher envolve a compreensão da repercussão, por exemplo, da maternidade e da responsabilidade dela com relação à família. “Esses elementos indicam a razão da menor remuneração das mulheres, do fato de estarem mais sujeitas ao desemprego e de terem mais dificuldades na progressão da carreira”. Ela ainda destacou a necessidade de se observar as especificidades das mulheres negras, que, pelo próprio processo de escravização do qual foram vítimas, sempre estiveram no mercado de trabalho, mas sem as proteções legais devidas. 

Negociação coletiva – A procuradora do MPT Ana Cláudia Rodrigues Bandeira Monteiro, ao falar sobre negociação coletiva, afirmou que, nos últimos tempos, tem ocorrido a desconstitucionalização dos direitos sociais, em especial dos direitos trabalhistas. “A constitucionalização desses direitos na Constituição de 1988 foi um grande ganho para a sociedade brasileira. Entretanto, desde 2016, tivemos alterações legislativas que impactaram o mundo do trabalho, como a Reforma Trabalhista (Lei n. 13.467/2017) e a Lei da Terceirização (Lei n. 13.429/2017), e enfraqueceram a atuação dos sindicatos e as negociações coletivas.” 

Monteiro acrescentou que as providências adotadas pelo Estado, por meio das Medidas Provisórias n. 927 e n. 936, no contexto da pandemia, impactaram ainda mais as negociações coletivas. “A MP n. 936, convertida na Lei n. 14.020, trouxe a possibilidade de redução de jornada e salários por acordos individuais, o que é flagrantemente inconstitucional”, avaliou. 

Em corroboração, a vice-presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Lydiane Machado e Silva, acrescentou que a retirada da obrigatoriedade do imposto sindical, trazida pela Reforma Trabalhista, à primeira vista, pode parecer uma medida que vai ao encontro da liberdade sindical; no entanto, sem a reforma relativa a outros dois aspectos – unicidade sindical e categoria econômica –, só fragiliza o sistema sindical e a negociação coletiva. 

Lydiane Machado ainda sustentou que o trabalho digno traz o pertencimento social e é a base civilizatória de qualquer sociedade. “A valorização e a proteção social do trabalho são bases de sustentação do capitalismo. Não é por acaso que a Constituição traz, logo em seu artigo primeiro, o valor social do trabalho em pé de igualdade com a livre iniciativa.” 

Relações trabalhistas no setor marítimo A procuradora do Trabalho Cirlene Luiza Zimmermann abordou a proteção ao trabalho portuário e aquaviário durante a crise sanitária. Em sua exposição, citou que, apesar de todos estarem aprendendo a lidar com o atual cenário, a pandemia evidencia a importância de se concretizarem os princípios da precaução e da prevenção tão relevantes para o Direito Ambiental. 

Segundo Zimmermann, com as devidas adequações, o MPT deu continuidade ao Projeto Ouro Negro, que realiza forças-tarefas em plataformas e navios petroleiros no país. “Como os riscos são desconhecidos e não se tem certeza dos meios de proteção mais adequados, o MPT se manteve próximo das empresas para entender as medidas adotadas, quais estavam dando certo e em quais pontos era possível evoluir”, acrescentou. 

Meio ambiente sadio no trabalho – O último painel do webinar trouxe aspectos relacionados ao direito fundamental ao meio ambiente sadio no trabalho. Ao tratar da temática, a procuradora regional do Trabalho Maria Amélia Bracks Duarte, representante do MPT do comitê de crise de Minas Gerais, apresentou algumas ações adotadas para promover o trabalho seguro nos diversos setores da economia do estado mineiro. 

Para finalizar, a procuradora Elaine Noronha Nassif ressaltou que a Covid-19 acelerou a Revolução Industrial 4.0, na qual o trabalho passou a ser mais dependente das tecnologias da informação. Ela destacou a ampliação do trabalho remoto, o home office, “uma modalidade que veio para ficar mesmo após a pandemia”. Segundo Nassif, os desafios são grandes, pois a residência passou a ser uma extensão do trabalho e, por essa razão, é preciso avaliar as implicações disso como ergonomia, saúde mental e jornada. “Tudo é muito novo, e o MPT está à frente desse processo, buscando aplicar nossa expertise. Esse trabalho que temos feito não vai se restringir ao período da pandemia”. 

Ao encerrar a atividade, o diretor-geral adjunto da ESMPU, Manoel Jorge e Silva Neto, enfatizou que a pandemia por Covid-19 produziu graves consequências no plano da vida em sociedade e, em especial, no campo do trabalho. Ele relembrou palavras do filósofo grego Heráclito de Éfeso (540-470 a.C.) para afirmar que momentos de crise experimentados pela humanidade servem de reflexão sobre os próprios destinos da humanidade. “Devemos extrair deste momento delicado as lições para crescermos como seres humanos e ajudarmos os mais vulneráveis. O MPT tem a tarefa de auxílio, de consolidação de uma tutela que não é o fim em si mesma”. 

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