O Direito Penal em tempos de pandemia: A violação ao isolamento social determinado por autoridades estaduais e municipais constitui crime?

publicado 21/05/2020 18h37, última modificação 22/05/2020 16h10

Por José Maria Panoeiro* e  Elisa Ramos Pittaro Neves**

1.     Considerações preliminares. 

Desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou estado de emergência global relacionado ao novo Coronavírus (COVID-19 ou SARS-COV-2), em 30/01/2020 [1], quando o patógeno alcançou 18 países, além da própria China, o suposto foco inicial, ao posterior reconhecimento da pandemia, em 11/03/2020 [2], o mundo assistiu perplexo um tipo de globalização absolutamente indesejável, a da contagem de mortos. Talvez a gripe espanhola que há cerca de um século contaminou um terço da população mundial possa ser o referencial mais próximo daquilo que hoje se presencia. [3]

A incompreensão acerca da forma de ataque do vírus ao corpo humano tem limitado as ações de saúde pública, pois não há vacina ou medicamento especificamente preparados para enfrentá-lo. Pesquisas em curso têm abordado a possibilidade de utilização de fármacos destinados a outras doenças (malária, artrite reumatoide, lúpus, v.g.) para o enfrentamento do vírus. [4] Dentro de tal quadro, ao que parece, torna-se inevitável recorrer à compreensão do aspecto global da economia para, nos dias atuais, ter em conta o retorno a determinadas substâncias e medidas de outrora para o enfrentamento da pandemia.

Durante muito tempo, o cloridrato de quinina, um fármaco produzido a partir da casca de uma árvore sulamericana, a Chinchona, foi o principal medicamento para o enfrentamento da malária. A história da saúde pública no Brasil demonstra que os sais de quinina somente perderam espaço devido ao desenvolvimento das drogas sintéticas antes mencionadas[5], que não dependiam tanto das fontes naturais para a produção do medicamento em larga escala. Contudo, a substância natural seguiu sendo utilizada no âmbito da medicina alternativa[6] tendo se revelado, inclusive, eficaz em hipótese onde a substância sintética tem falhado.[7] Teria sido, portanto, a necessidade econômica de não depender de uma fonte exclusiva, limitada e distante o móvel do desenvolvimento da substância sintética e, consequentemente, de maior lucro para a indústria farmacêutica.

Ocorre que o entrelaçamento de questões econômicas com diversas outras como a própria organização da sociedade, seu aspecto jurídico, inclusive penal, tem sido cada vez mais explícita. Não obstante goze a economia de elevado prestígio entre as ciências sociais, em especial por sua capacidade de revelar a lógica por trás de uma ampla gama de comportamentos humanos, ela não presta para alcançar, muitas das vezes, a realidade. Cálculos matemáticos de custos e benefícios funcionam bem dentro de uma ótica individualizada onde há uma única demanda, o ganho econômico ou lucro, mas parecem falhar quando transposta para um ambiente coletivo. Escolhas racionais propiciaram nosso maior acesso aos alimentos, mas, paradoxalmente, criaram uma epidemia de obesidade que compromete a saúde pública demandando mais recursos para novas enfermidades.[8] Como se percebe, há, também, o efeito reverso, novas doenças demandam novos remédios e novos equipamentos médicos, o que alimenta a espiral econômica de deslocar as atividades para lugares onde o resultado seja mais proveitoso.

Um mundo globalizado, que nos permite ter acesso a produtos que embutem tecnologia inimaginável há meio século, parece perfeito. Ocorre que, a mundialização dos mercados, que impôs a lógica de deslocamento das atividades econômicas para países que oferecem menos custos sociais às empresas, acaba por cavar mais fundo o buraco existente entre países ricos e pobres.[9] O enfraquecimento do poder do Estado diante de empresas globais repercute, igualmente, em menores possibilidades de acesso a insumos químicos e farmacêuticos, bem como a equipamentos médico-hospitalares que carreiam melhores tecnologias, com clara afetação dos direitos humanos.[10] Empresas, e não Estados, passam a concentrar decisões fundamentais sobre nossos destinos, ainda que não tenhamos capacidade de perceber. Nossos governantes parecem fazer, há décadas, ouvidos moucos ao princípio da soberania nacional econômica (art. 170, I) cumprindo o ritual de adequação aos interesses do mercado. Parecem ignorar que o Estado que cede ao exclusivo interesse do mercado abre mão de seu papel conformador da realidade. Em outras palavras, pelo princípio citado, que é um instrumento para assegurar a todos uma existência digna, deveria o Estado atuar por meio de políticas públicas para fomentar o desenvolvimento nacional e permitir a integração no mercado internacional em condições de igualdade.[11] Não é o que ocorre, falta-nos uma política de desenvolvimento econômico para um país de dimensões continentais, somos dependentes de cadeias de suprimento internacionais, como ocorre agora em relação a insumos farmacêuticos e respiradores pulmonares. Entretanto, como ocorreu na crise financeira de 2008, o Estado é chamado mais uma vez a intervir, agora para limitar os gravames de uma crise que não é econômica, mas de saúde pública, ainda que possa se tornar, também, uma crise econômica de proporções globais. Naquele momento, como está registrado, foram operações especulativas que deflagraram a crise mundial[12], hoje, ao que parece, a adoção de medidas de contenção para a propagação da doença seria o móvel de nova crise.

É preciso dizer, contudo, que o cenário de uma crise de saúde de proporções mundiais e seus reflexos econômicos não é propriamente uma surpresa. Em 2003, quando da primeira grande emergência do século XXI, a SARS[13], a Organização Mundial da Saúde já levantava a preocupação com o fato de que doenças infecciosas representavam uma ameaça à saúde global, ao funcionamento dos sistemas de saúde, bem como à estabilidade e crescimento das economias.[14]Em que pese tal advertência, o vírus da espiral especulativa associado às políticas neoliberais de desregulação dos mercados financeiros deflagrou outra crise global[15], ou seja, viu ser sucedido no enredo da mundialização pelo Covid-19 e o Estado é chamado, mais uma vez, a adotar medidas para equacionar o problema social (saúde pública) e econômico. Todavia, a séria ameaça à saúde pública de cada país e a falta de recursos materiais, humanos e de capital para enfrentar tal pandemia tem levado à adoção de medidas de contenção de outrora, como a quarentena ou o isolamento social.[16]

Destarte, dentro de uma proposta meramente reflexiva e não exauriente, o que se indaga é sobre a possibilidade, diante do quadro normativo posto, de que o Direito Penal seja, em especial o art. 268 do Código Penal, utilizado como instrumento de controle para conter a circulação de pessoas e, com isso, evitar a propagação do patógeno. Desde logo é preciso considerar que o Superior Tribunal de Justiça tem negado salvo conduto (habeas corpus), em cognição sumária, destinado a viabilizar a livre circulação de pessoas sem a responsabilidade criminal pelo delito citado (STJ: HC 573208/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, decisão monocrática em 17/04/2020).[17] O que chama a atenção, porém, é a delegação a Estados e Municípios da possibilidade de instituírem medidas restritivas com finalidade de contenção da circulação do vírus e cuja violação poderia gerar a responsabilidade penal pelo delito em questão. A diversidade de medidas adotadas já denotaria algum tipo de perplexidade pela aparente negativa à isonomia penal diante de um fato que é único e nacional, a epidemia pelo Covid-19. E é sobre os limites legítimos da intervenção penal que se está a cogitar e refletir. 
 

2.     O tipo penal de infração de medida sanitária preventiva. 

O Código Penal de 1940 tem todo um capítulo dedicado aos crimes contra a saúde pública e que se localiza no título dos crimes contra a incolumidade pública. Essa expressão há de ser compreendida como “o estado de preservação ou segurança em face de possíveis eventos lesivos”.[18] Como assenta a doutrina, “incolumitas, no latim –, se refere ao estado de segurança ou firmeza esperado no que diz respeito a vida, integridade física ou patrimônio da generalidade das pessoas”.[19]

Sobre os crimes entabulados em tal rubrica Hungria discorria: 

Tão relevante é esse interesse, que a lei do Estado entendeu de reconhecer, na espécie, um bem jurídico merecedor da reforçada tutela penal, incriminando certos fatos pela simples criação do perigo de dano à vida, à integridade física ou ao patrimônio de pessoas indefinidamente consideradas. O nosso Cód. Penal, depois de, na classe dos crimes contra a pessoa e sob a rubrica de “periclitação da vida e da saúde”, incrimina especialmente fatos que põem em risco a incolumidade individual, isto é, circunscrita a pessoa ou pessoas individualmente determinadas, cuidou, em título autônomo, sob a epígrafe “Dos crimes contra a incolumidade pública”, de fatos que acarretam situação de perigo a indeterminado ou não individuado número de pessoas ou coisas.[20] 

Tais lições parecem conduzir à compreensão da incolumidade pública, em quaisquer de seus desdobramentos, como um bem jurídico relacionado a um estado de segurança desejável no ambiente social. Portanto, não é algo que se refira diretamente à afetação de interesses individuais como a vida, o patrimônio ou a saúde, mas sim a um estado desejável. A decisão político-criminal se coloca em linha com a gestão de riscos no ambiente social com inspiração no princípio da precaução.[21]O desenvolvimento da saúde pública como bem jurídico é relativamente recente, pois na antiguidade, ressalta Muñoz Conde[22], os problemas referentes à higiene e sanidade sociais estavam fortemente influenciados por ideias religiosas, mágicas ou na crença de que a enfermidade ou a morte eram castigos divinos. Em outras palavras, independentes da vontade humana, e que só caberia ao homem suportá-los. Destarte, a saúde pública há de ser entendida como um valor comunitário imanente à convivência humana.[23] Em outras palavras, é a transformação do direito individual de não ter a saúde perturbada num direito coletivo, posto que a afetação agora se dirige a um número indeterminados de indivíduos dentro do grupo social.[24][25]

Tomando por empréstimo a dogmática espanhola[26] que cuida do delito de falsificação de medicamentos, ao que parece, fica clara a ideia de que a tutela da saúde pública implica na responsabilidade do Estado pela adoção de políticas públicas de caráter preventivo nessa quadra. É possível traçar aqui um paralelo entre as Constituições espanhola (art. 43)[27]e brasileira (art. 196)[28] na medida em que ambas reconhecem o direito à proteção da saúde e determinam que as autoridades públicas são responsáveis ​​por sua proteção. Subliminarmente a tal proteção estaria, entre outras, a questão da segurança farmacológica, o que implica que todo o processo deve envolver agentes públicos e privados, bem como ser controlado por normas legais que garantam prevenção e redução de riscos.[29] A atuação do Estado nesse âmbito não se limita, contudo, ao resguardo na circulação de medicamentos, como na doutrina colhida. Envolve, por outro lado, uma série de ações no âmbito da saúde pública que decorrem da competência comum de todos os entes da federação como  se constata, por exemplo, no fato de que são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde (STF, RE 855.178-ED, rel. p/ o ac. min. Edson Fachin, DJE 16/04/2020).[30]

Dentro dos tipos penais dirigidos à tutela da saúde pública sobressai o crime previsto no artigo 268 do Código Penal: 

Infração de medida sanitária preventiva 

Art. 268 - Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa:
Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa. 

Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se o agente é funcionário da saúde pública ou exerce a profissão de médico, farmacêutico, dentista ou enfermeiro. 

Trata-se de um típico caso de lei penal em branco e seu complemento são as eventuais determinações do poder público relativas a medidas preventivas contra a incursão ou difusão de moléstia contagiosa (transmissível por contágio).[31] Souza e Japiassú afirmam que a norma penal surge como reforço à eficácia de providências adotadas para impedir a introdução ou a propagação de doença contagiosa, como ocorre com a epidemia[32] do coronavírus.[33]O progresso da medicina e da higiene social fizeram com que uma série de enfermidades sociais fossem prevenidas com a vacinação e com os controles sanitários.[34] Contudo, em determinados casos, o surgimento de novas doenças ou a mutação dos patógenos de doenças já existentes podem motivar a adoção de outras medidas para evitar a propagação da moléstia, ao menos até que seja desenvolvido um tratamento adequado ou uma vacina que contenha a circulação do vírus. Como ressalta a doutrina, o tipo penal em questão tem por escopo “fortalecer as ações de prevenção contra doenças contagiosas tomadas pelo poder público por meio daquilo que se pode denominar de gestão penal de riscos”.[35] Nesta quadra, a antecipação da barreira de proteção penal alcança atos que seriam, em princípio, preparatórios de outros delitos ou indiferentes penais.

Quanto às normas complementares que dão base ao tipo, segundo Hungria, poderão ser, ou não, de caráter permanente e “poder público quer dizer, aqui, autoridade competente (federal, estadual ou municipal)”.[36] Contudo, embora em seus exemplos o autor faça referência, apenas, a editais e portarias oficialmente publicadas para o conhecimento geral, o que parece adequado às situações de emergências, ao que parece, nada impede que a lei imponha tais restrições.[37] Trata-se de um crime doloso, de perigo comum (para um número indeterminado de pessoas), é presumido ou abstrato[38], em suma, não demanda a demonstração concreta do perigo do contágio de terceiros pelo coronavírus.[39] É exigível, porém, que a medida tenha caráter obrigatório e não de mera recomendação.

 O crime consuma-se com o simples fato da transgressão da medida ou determinação. Esta deve ter caráter obrigatório (quer no sentido de um facere, quer no de um omittere) e não de mero conselho ou advertência. [...] Não é necessário que sobrevenha efetivamente a introdução ou propagação da doença. Assim, o indivíduo que consegue escapar à quarentena (exemplo de Soler, ob. Cit. pág. 168), ou fugir do “campo de concentração” ou hospital de isolamento, responderá pelo crime ainda que não estivesse afetado pela doença.[40](sem grifo no original) 

Outrossim, como descrito acima por Hungria, o que importa é a violação da medida sanitária imposta. A necessidade de contaminação por parte do autor para o cometimento do crime não é uma questão definida ao nível do tipo, embora possa constar das normas complementares. Em outras palavras, é possível que o complemento se dirija a pessoas específicas, por exemplo, que já tenham sido diagnosticadas como portadoras da doença ou contagiadas, mas assintomáticas. Contudo, não se exclui a possibilidade de que a norma, alternativamente, acabe por se dirigir a todos, independentemente de sua condição de saúde. É a norma complementar que delimitará tal questão. Pretende-se, com isso, evitar que o agente facilite a propagação da doença por meio do comportamento proibido. No que toca às determinações sanitárias de caráter temporário, registra Hungria, que sua revogação não importará em extinção da punibilidade[41], pois do caráter temporário do complemento decorre a ultratividade da norma penal.

 
3.     O quadro normativo subjacente ao delito de violação de infração sanitária (art. 268, CP). 

A apreciação do tipo penal, enquanto norma penal em branco, reclama a apreciação de um conjunto de disposições normativas, bem como de algumas decisões provisórias do Supremo Tribunal Federal (STF), que discutem a existência de competência no âmbito de Estados e Municípios para a adoção de restrições. Não se ignora que o pano de fundo da controvérsia levada ao Tribunal Supremo carrega nas tintas a falta de coordenação entre os mandatários dos diversos entes da federação. Não obstante, essa questão não é de relevo no âmbito do presente texto, muito embora tal quadro tenha sido, inclusive, descrito em decisão monocrática do Ministro do STF Alexandre de Moraes.

Em momentos de acentuada crise, o fortalecimento da união e a ampliação de cooperação entre os três poderes, no âmbito de todos os entes federativos, são instrumentos essenciais e imprescindíveis a serem utilizados pelas diversas lideranças em defesa do interesse público, sempre com o absoluto respeito aos mecanismos constitucionais de equilíbrio institucional e manutenção da harmonia e independência entre os poderes, que devem ser cada vez mais valorizados, evitando-se o exacerbamento de quaisquer personalismos prejudiciais à condução das políticas públicas essenciais ao combate da pandemia de COVID-19. Lamentavelmente, contudo, na condução dessa crise sem precedentes recentes no Brasil e no Mundo, mesmo em assuntos técnicos essenciais e de tratamento uniforme em âmbito internacional, é fato notório a grave divergência de posicionamentos entre autoridades de níveis federativos diversos e, inclusive, entre autoridades federais componentes do mesmo nível de Governo, acarretando insegurança, intranquilidade e justificado receio em toda a sociedade. (ADPF 672, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJE nº 89, divulgado em 14/04/2020)

 Ao se pronunciar monocraticamente na ADPF 672, o relator, embora tenha rechaçado a intervenção no juízo de conveniência e oportunidade do chefe do Executivo Federal, o que era um dos objetivos do impetrante da ADPF, afirmou a competência concorrente entre União, Estados e Municípios[42] para a promoção de ações dirigidas à contenção da situação de calamidade gerada pela pandemia COVID-19. 

Por outro lado, em respeito ao Federalismo e suas regras constitucionais de distribuição de competência consagradas constitucionalmente, assiste razão à requerente no tocante ao pedido de concessão de medida liminar, “para que seja determinado o respeito às determinação (sic) dos governadores e prefeitos quanto ao funcionamento das atividades econômicas e as regras de aglomeração”. A adoção constitucional do Estado Federal gravita em torno do princípio da autonomia das entidades federativas, que pressupõe repartição de competências legislativas, administrativas e tributárias. Em relação à saúde e assistência pública, inclusive no tocante à organização do abastecimento alimentar, a Constituição Federal consagra, nos termos dos incisos II e IX, do artigo 23, a existência de competência administrativa comum entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios. (ADPF 672, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJE nº 89, divulgado em 14/04/2020)

O aventado quadro de competências concorrentes foi, igualmente, afirmado pelo Plenário do STF na ratificação da liminar na ADI 6341, que se voltava contra alterações promovidas pela MP 926/2020 na Lei n. 13.979/2020. 

O Tribunal, por maioria, referendou a medida cautelar deferida pelo Ministro Marco Aurélio (Relator), acrescida de interpretação conforme à Constituição ao § 9º do art. 3º da Lei nº 13.979, a fim de explicitar que, preservada a atribuição de cada esfera de governo, nos termos do inciso I do art. 198 da Constituição, o Presidente da República poderá dispor, mediante decreto, sobre os serviços públicos e atividades essenciais, vencidos, neste ponto, o Ministro Relator e o Ministro Dias Toffoli (Presidente), e, em parte, quanto à interpretação conforme à letra b do inciso VI do art. 3º, os Ministros Alexandre de Moraes e Luiz Fux. Redigirá o acórdão o Ministro Edson Fachin. Falaram: pelo requerente, o Dr. Lucas de Castro Rivas; pelo amicus curiae Federação Brasileira de Telecomunicações – FEBRATEL, o Dr. Felipe MonneratSolon de Pontes Rodrigues; pelo interessado, o Ministro André Luiz de Almeida Mendonça, Advogado-Geral da União; e, pela Procuradoria-Geral da República, o Dr. Antônio Augusto Brandão de Aras, Procurador-Geral da República. Afirmou suspeição o Ministro Roberto Barroso. Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello. Plenário, 15.04.2020 (Sessão realizada inteiramente por videoconferência - Resolução 672/2020/STF).[43] 

Repetiu-se no julgamento da ADI 6341 o entendimento esposado pelo Ministro Alexandre de Moraes na decisão monocrática da ADPF 672. 

Dessa maneira, não compete ao Poder Executivo federal afastar, unilateralmente, as decisões dos governos estaduais, distrital e municipais que, no exercício de suas competências constitucionais, adotaram ou venham a adotar, no âmbito de seus respectivos territórios, importantes medidas restritivas como a imposição de distanciamento/isolamento social, quarentena, suspensão de atividades de ensino, restrições de comércio, atividades culturais e à circulação de pessoas, entre outros mecanismos reconhecidamente eficazes para a redução do número de infectados e de óbitos, como demonstram a recomendação da OMS (Organização Mundial de Saúde) e vários estudos técnicos científicos, como por exemplo, os estudos realizados pelo Imperial Collegeof London, a partir de modelos matemáticos (The Global Impact of COVID-19 and Strategies for Mitigationand Suppression, vários autores; Impact of non-pharmaceutical interventions (NPIs) to reduce COVID19 mortality and health care demand, vários autores). (ADPF 672, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJE nº 89, divulgado em 14/04/2020) 

Contudo, ainda que a questão pareça ter restado equacionada, há mais controvérsias por trás daquilo que há de se entender por competências concorrentes e quanto ao evidente limite de atuação de cada ente da Federação. É o que se constata na delimitação temática feita pelo Procurador-Geral da República em seu parecer na ADI 6341. 

Ante tal panorama, insurge-se a presente ação direta de inconstitucionalidade contra normas acrescidas à Lei 13.979/2020 pela MP 926/2020, por meio das quais se limitou o alcance de algumas das medidas de enfrentamento ao coronavírus, com vistas ao resguardo das atividades e serviços públicos de caráter essencial. Visa o partido autor a obter o reconhecimento de que, em decorrência da autonomia política e da competência material comum em tema de proteção da saúde, Estados, Distrito Federal e Municípios possam determinar as atividades e serviços públicos revestidos de essencialidade no respectivo território e, com isso, impor as medidas de isolamento, quarentena e restrição de locomoção independentemente dos condicionamentos traçados pela MP 926/2020, em especial a exigência de articulação prévia com o órgão regulador ou poder concedente ou autorizador (Lei 13.979/2020, art. 3º, § 10). (sem grifo no original)[44] 

Em linhas gerais, a definição dos limites constitucionais da atuação de cada ente dá contornos concretos ao tipo penal em questão. Tomado em outra perspectiva, uma atuação fora do âmbito constitucional e legalmente permitidos, por evidente, torna ilegítima a incriminação. E dentro desses limites de atuação no que toca à saúde pública, conforme colacionado no parecer ministerial citado, que se apoia em Sarlet e Filchtiner, a regionalização e descentralização das ações do Sistema Único de Saúde (art. 198, I, C.R.F.B.)[45]não impede a atuação do ente central, inclusive para fins de harmonização das práticas, eficiência no emprego de recursos públicos e integral atendimento à população.[46]

Outrossim, embora reconhecido a governadores e prefeitos o poder de adotar medidas de restrição, parece intuitivo, em primeiro lugar, que não podem interferir em funcionamento de serviços de competência da União (aeroportos e portos, rodovias federais, transporte rodoviário interestadual ou internacional, telecomunicações, funcionamento do sistema financeiro, serviço postal, entre outros), conforme art. 21 da Constituição da República. A disputa em torno da competência gravita, sob a perspectiva jurídica, na definição do que são serviços essenciais, que estariam excluídos do alcance das restrições previstas na Lei n. 13.979/2020 conforme parágrafo 8º do art. 3º. 

Art. 3º  Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, dentre outras, as seguintes medidas: (Redação dada pela Medida Provisória nº 926, de 2020) 
[...]
§ 8º  As medidas previstas neste artigo, quando adotadas, deverão resguardar o exercício e o funcionamento de serviços públicos e atividades essenciais. (Incluído pela Medida Provisória nº 926, de 2020) 

Os serviços assim elencados não seriam alcançados por medidas restritivas que poderiam ser impostas por governadores e prefeitos. Não é preciso ressaltar que a falta de coordenação das ações, pelos mais variados motivos que se apresentam, legítimos ou não, pode acarretar a própria inutilidade das medidas adotadas, pois não impedirá nova circulação do vírus.

E tal aspecto é o que demarca a competência da União em sede de competência concorrente. Tomado em outros termos, vivenciamos no país uma epidemia de alcance nacional, e não simplesmente algo limitado a determinados Estados ou Municípios da Federação. Foi o que demarcou com precisão o Procurador-Geral da República, Dr. Augusto Aras, em seu parecer na ação direta de inconstitucionalidade mencionada.

Apesar de seus contornos fluidos, o modelo de condomínio legislativo ditado pela Constituição Federal, em matéria de competência concorrente, norteia-se pelo princípio da predominância do interesse.11 Cabe à União, no que concerne à proteção da saúde, editar normas gerais que busquem a coordenação nacional; aos Estados, compete regular temáticas de interesse regional, em suplementação às normas gerais nacionais. Por sua vez, aos Municípios, cabe legislar a respeito de temas de interesse local (CF, art. 30, I), observadas as regras federais e estaduais estabelecidas sobre a matéria. Estados somente exercem competência suplementar de forma plena se inexistir lei federal, e assim mesmo, para atender a suas peculiaridades.[47] 

Dentre as medidas previstas na Lei n. 13.979/2002 destinadas à contenção da epidemia devem ser destacados o isolamento, a quarentena e a restrição à entrada e saída do país ou locomoção interestadual e intermunicipal. Embora a análise se restrinja às das medidas, ao que parece, a interpretação alinhada será manejável em todas as demais previstas na lei em questão.

Art. 3º  Para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, dentre outras, as seguintes medidas: (Redação dada pela Medida Provisória nº 926, de 2020) 
I - isolamento; 
II - quarentena; 
[...] 
VI - restrição excepcional e temporária, conforme recomendação técnica e fundamentada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, por rodovias, portos ou aeroportos de: (Redação dada pela Medida Provisória nº 926, de 2020) 
a) entrada e saída do País; e (Incluído pela Medida Provisória nº 926, de 2020) 
b) locomoção interestadual e intermunicipal; (Incluído pela Medida Provisória nº 926, de 2020) 

Quando às duas primeiras figuras, o isolamento e a quarentena, eles estão definidos na própria Lei n. 13.979/2020 que se alinha, como consta do próprio artigo 2º, com o Regulamento Sanitário Internacional. 

Art. 2º  Para fins do disposto nesta Lei, considera-se: 
I - isolamento: separação de pessoas doentes ou contaminadas, ou de bagagens, meios de transporte, mercadorias ou encomendas postais afetadas, de outros, de maneira a evitar a contaminação ou a propagação do coronavírus; e 
II - quarentena: restrição de atividades ou separação de pessoas suspeitas de contaminação das pessoas que não estejam doentes, ou de bagagens, contêineres, animais, meios de transporte ou mercadorias suspeitos de contaminação, de maneira a evitar a possível contaminação ou a propagação do coronavírus. 
Parágrafo único.  As definições estabelecidas pelo Artigo 1 do Regulamento Sanitário Internacional, constante do Anexo ao Decreto nº 10.212, de 30 de janeiro de 2020, aplicam-se ao disposto nesta Lei, no que couber. 

Não havendo testes disponíveis para verificação da população como um todo, por certo que a medida de isolamento ficará restrita às pessoas que, tendo manifestado sintomas da doença, venham a ser testadas e acusem positivo para o vírus. A quarentena, por outro lado, como se destina à separação de pessoas contaminadas daquelas saudáveis, em tese, pode alcançar pessoas que não apresentam sintomas relacionados à COVID-19. Ocorre que, ao que parece, não se pode inferir diretamente da lei em questão e de sua regulamentação todo o âmbito de permissão à imposição de restrições por parte dos chefes do Poder Executivo estadual e municipal. Como ressalta Machado, “a Justiça é um valor ético e às normas de Direito inere a pretensão de realizar este valor”.[48]Portanto, se ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei (art. 5º, II, C.R.F.B.), por certo que dispositivos do ordenamento jurídico devem guardar entre si a coordenação que falta aos homens, em especial quando importem na incriminação de comportamentos.O parecer do Procurador-Geral da República, ao ressaltar a existência da Lei n. 8.080/90 e do Decreto 7.616/2011, fez referência a uma compreensão sistemática das normas que incidem no enfrentamento da pandemia.

Na esfera do ente central da Federação, editou-se a Lei 8.080, de 19.9.1990, que, ao dispor sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, regulou, em todo o território nacional, as ações e serviços públicos de saúde. Nos arts. 16 a 19, o diploma fixou áreas de atuação de cada ente da Federação em tema de saúde, inserindo, no campo reservado à direção nacional do SUS, a coordenação do sistema de vigilância epidemiológica e a coordenação e a execução das respectivas ações, sobretudo em circunstâncias excepcionais suscetíveis de acarretar agravos inusitados à saúde ou risco de disseminação nacional: 

Art. 16. A direção nacional do Sistema Único da Saúde (SUS) compete: 
(…) 
III - definir e coordenar os sistemas: a) de redes integradas de assistência de alta complexidade;
b) de rede de laboratórios de saúde pública; 
c) de vigilância epidemiológica; e 
d) vigilância sanitária; 
(…) 
VI - coordenar e participar na execução das ações de vigilância epidemiológica
(…) 
Parágrafo único. A União poderá executar ações de vigilância epidemiológica e sanitária em circunstâncias especiais, como na ocorrência de agravos inusitados à saúde, que possam escapar do controle da direção estadual do Sistema Único de Saúde (SUS) ou que representem risco de disseminação nacional. 

A regulamentação do parágrafo único do art. 16 da Lei 8.080/1990 veio com o Decreto 7.616, de 17.11.2011, que dispôs sobre a “declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional – ESPIN”, estabelecendo as hipóteses de adoção da medida.[49] (sem grifo no original) 

Foi com base no Decreto 7.616/2011, que define Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN)[50], o que inclui situações epidemiológicas de gravidade elevada e que apresentem risco de disseminação nacional, que o Ministro da Saúde, por meio da Portaria 188/2020, declarou a ESPIN e estabeleceu um centro de operações para coordenação das ações de enfrentamento à epidemia. 

Art. 2º Estabelecer o Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE-nCoV) como mecanismo nacional da gestão coordenada da resposta à emergência no âmbito nacional. 
Parágrafo único. A gestão do COE estará sob responsabilidade da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS/MS). 
Art. 3º Compete ao COE-nCoV:  
I- planejar, organizar, coordenar e controlar as medidas a serem empregadas durante a ESPIN, nos termos das diretrizes fixadas pelo Ministro de Estado da Saúde;  
II- articular-se com os gestores estaduais, distrital e municipais do SUS;
III- encaminhar ao Ministro de Estado da Saúde relatórios técnicos sobre a ESPIN e as ações administrativas em curso;
 IV - divulgar à população informações relativas à ESPIN; e
V - propor, de forma justificada, ao Ministro de Estado da Saúde: 
a) o acionamento de equipes de saúde incluindo a contratação temporária de profissionais, nos termos do disposto no inciso II do caput do art. 2º da Lei nº 8.745, de 9 de dezembro de 1993; b) a aquisição de bens e a contratação de serviços necessários para a atuação na ESPIN;
c) a requisição de bens e serviços, tanto de pessoas naturais como de jurídicas, nos termos do inciso XIII do caput do art. 15 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990; e
d) o encerramento da ESPIN.[51] (sem grifo no original) 

Estabelecidas todas essas premissas normativas existem dois dispositivos dentro da Lei n. 13.979/2020 que merecem destaque dentro dessa ação de coordenação da União das ações de enfrentamento ao COVID-19 e a remissão a ser feita a outras esferas. A primeira diz com a necessidade de ato do Ministro da Saúde para fixar as condições das medidas de isolamento (art. 3º, I) e quarentena (art. 3º, II), bem como conceder autorização excepcional para importação de produtos não registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (art. 3º, VIII) previstas na lei.

Art. 3º. [...] § 5º  Ato do Ministro de Estado da Saúde: 
I - disporá sobre as condições e os prazos aplicáveis às medidas previstas nos incisos I e II do caput deste artigo; e 
II - concederá a autorização a que se refere o inciso VIII do caput deste artigo.

A segunda norma diz com a edição de uma portaria interministerial que trataria de restrições à circulação de determinados meios de transporte.

Art. 3º. 
[...]
§ 6º  Ato conjunto dos Ministros de Estado da Saúde, da Justiça e Segurança Pública e da Infraestrutura disporá sobre a medida prevista no inciso VI do caput.       (Redação dada pela Medida Provisória nº 927, de 2020)

São estes âmbitos que delimitam a atuação da esfera administrativa federal e que abrem espaço para a legitimação da adoção de medidas no âmbito de Estados e Municípios permitindo, assim, a caracterização do delito do artigo 268. É de relevo assentar que a própria Lei n. 13.979/2020 diz da possibilidade de responsabilidade legal daquele que descumprir as medidas de contenção impostas, mas sem dizer tratar-se de responsabilidade penal (“Art. 3º [...] § 4º  As pessoas deverão sujeitar-se ao cumprimento das medidas previstas neste artigo, e o descumprimento delas acarretará responsabilização, nos termos previstos em lei.”).

Seguiram-se, então duas portarias que irão dar concretude às medidas de restrição. A Portaria nº 356, de 11 de março de 2020, do Ministro da Saúde, que trata especificamente da regulamentação das medidas para enfrentamento da ESPIN e, ainda, a Portaria Interministerial nº 5, de 17 de março de 2020, dos Ministros da Saúde e da Justiça e Segurança Pública, que cuida da compulsoriedade das medidas para enfrentamento da emergência.

A Portaria nº 356/2020 autoriza a decretação de isolamento e quarentena.Como se trata de ato infralegal, como é intuitivo, não pode transbordar dos limites da legislação que lhe dá substrato. Por tais razões, o isolamento, como resta indicado na lei como medida voltada para pessoas contaminadas pelo vírus (art. 2º, I, Lei n. 13.979/2020), somente tem incidência depois de comprovado por exame laboratorial e clínico o estado do potencial autor do delito.Outrossim, a Portaria nº 356/2020, ao prever duas formas de isolamento, uma por determinação médica e outra por recomendação do agente de vigilância epidemiológica, ao que parece, exorbita os limites legais  

Art. 3º A medida de isolamento objetiva a separação de pessoas sintomáticas ou assintomáticas, em investigação clínica e laboratorial, de maneira a evitar a propagação da infecção e transmissão local. 
§ 1º A medida de isolamento somente poderá ser determinada por prescrição médica ou por recomendação do agente de vigilância epidemiológica, por um prazo máximo de 14 (quatorze) dias, podendo se estender por até igual período, conforme resultado laboratorial que comprove o risco de transmissão. 

§ 2º A medida de isolamento prescrita por ato médico deverá ser efetuada, preferencialmente, em domicílio, podendo ser feito em hospitais públicos ou privados, conforme recomendação médica, a depender do estado clínico do paciente.
§ 3º Não será indicada medida de isolamento quando o diagnóstico laboratorial for negativo para o SARSCOV-2. (sem grifo no original) 

Deste modo, tal como descrito por Hungria[52], o isolamento por “recomendação” não tem o condão de legitimar a incidência do tipo penal que só se completa se a medida for obrigatória. Nesses termos, apenas quando a medida for prescrita por médico, após prévio exame. Ademais, a Portaria nº 356/2020 deixou assente a necessidade de assinatura de termo de consentimento informado (Art. 3º. [...] § 4º A determinação da medida de isolamento por prescrição médica deverá ser acompanhada do termo de consentimento livre e esclarecido do paciente, conforme modelo estabelecido no Anexo I.).

Outrossim, a supostamente equivocada referência feita na Portaria Interministerial 5/2020 à comunicação do agente quanto à compulsoriedade da medida, mas referindo-se ao termo de consentimento informado relacionado ao isolamento por “recomendação” em nada alteram a substância do acima alinhado.

Art. 4º O descumprimento das medidas previstas no inciso I e nas alíneas "a", "b" e "e" do inciso III do caput do art. 3º da Lei nº 13.979, de 2020, poderá sujeitar os infratores às sanções penais previstas nos art. 268 e art. 330 do Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, se o fato não constituir crime mais grave. 
§ 1º Nas hipóteses de isolamento, para configuração do descumprimento de que trata o caput, há necessidade de comunicação prévia à pessoa afetada sobre a compulsoriedade da medida, nos termos do § 7º do art. 3º da Portaria nº 356/GM/MS, de 11 de março de 2020. 

É que nenhuma das duas portarias poderia exorbitar o âmbito do isolamento previsto descrito na lei o qual, como é intuitivo, depende de comprovação por meio de exame laboratorial de sua condição.Não há crime se estamos diante de mera recomendação, o pressuposto do delito é a compulsoriedade e a condição de infectado.

Por outro lado, no que toca à medida de quarentena, tal como descrito no artigo 2º II, da Lei n. 13.979/2020, ela diz respeito, precipuamente, à restrição de atividades e separação de pessoas.

O primeiro ponto foi justamente o motivador do pronunciamento do STF acerca de um possível avanço do Poder Executivo Federal na esfera de atuação dos demais entes. Sob outra perspectiva:  quem pode restringir atividades e com qual fundamento?

Não há dúvidas que o funcionamento do comércio é matéria que toca ao poder de polícia local, ou seja, a autorização para funcionamento concedida pelo Município tem como corolário a possibilidade de sua suspensão. Do mesmo modo, o poder de polícia do Estado, naquilo que lhe toca autorizar ou permitir o funcionamento (serviços públicos de sua titularidade, autorizações do Corpo de Bombeiros para funcionamento de estabelecimentos ou eventos, etc.), possibilita a restrição das atividades.

Porém, é no ponto relativo à separação de “separação de pessoas suspeitas de contaminação das pessoas que não estejam doentes” visando “evitar a possível contaminação ou a propagação do coronavírus”, conforme os termos legais, parece necessitar de maiores reflexões. Para dar um colorido à questão é possível visitar algumas disposições e conceitos do Regulamento Sanitário Internacional da OMS (Decreto 10.212, de 30 de janeiro de 2020). 

Artigo 1 Definições 
1. Para os fins do Regulamento Sanitário Internacional (doravante denominado “RSI” ou “Regulamento”):  
[...]
“quarentena” significa a restrição das atividades e/ou a separação de pessoas suspeitas de pessoas que não estão doentes ou de bagagens, contêineres, meios de transporte ou mercadorias suspeitos, de maneira a evitar a possível propagação de infecção ou contaminação; 
Artigo 18 Recomendações relativas a pessoas, bagagens, cargas, contêineres, meios de transporte, mercadorias e encomendas postais 
1. Nas recomendações que formule aos Estados Partes em relação a pessoas, a OMS poderá incluir as seguintes orientações:
[...]
- implementar quarentena ou outras medidas de saúde pública para pessoas suspeitas; (sem grifo no original)

Como se constata do próprio Regulamento Sanitário Internacional da OMS, a medida de quarentena se dirige a pessoas suspeitas, que deverão ser separadas das pessoas não suspeitas. Ponderada essa questão é de se indagar: decreto municipal que proíbe acesso às praias poderia ter conduzido à detenção de dois surfistas na cidade de Ubatuba, que não tem casos confirmados de Covid-19, por suposta violação ao isolamento?[53] Qual a diferença entre os citados indivíduos e duas pessoas que circulam pela cidade deserta com distância de um metro entre elas? E de um casal que sai para ir ao mercado junto? Todos estariam violando a quarentena e incidindo nas penas do art. 268 do CP?

Contudo, ao que parece, andou mal o Ministro da Saúde ao fixar as condições para a adoção da quarentena, pois se furtou de definir as pessoas suspeitas, aquelas que devem ser separadas daquelas que não estão contaminadas. 

Portaria nº 356/2020 

Art. 4º A medida de quarentena tem como objetivo garantir a manutenção dos serviços de saúde em local certo e determinado. 

§ 1º A medida de quarentena será determinada mediante ato administrativo formal e devidamente motivado e deverá ser editada por Secretário de Saúde do Estado, do Município, do Distrito Federal ou Ministro de Estado da Saúde ou superiores em cada nível de gestão, publicada no Diário Oficial e amplamente divulgada pelos meios de comunicação. 

§ 2º A medida de quarentena será adotada pelo prazo de até 40 (quarenta) dias, podendo se estender pelo tempo necessário para reduzir a transmissão comunitária e garantir a manutenção dos serviços de saúde no território.

§ 3º A extensão do prazo da quarentena de que trata o § 2º dependerá de prévia avaliação do Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE-nCoV) previsto na Portaria nº 188/GM/MS, de 3 de fevereiro de 2020. 

A justificativa lacônica de garantir a manutenção dos serviços de saúde em local certo e determinado não delimita critérios mínimos para identificação daqueles que são pessoas suspeitas de estarem contaminadas. São tais pessoas que devem ser colocadas em quarentena, conforme o Decreto 10.212/2020 e a Lei n. 13.979/2020. Por tais razões parece ser desarrazoada a prisão de pessoas que se encontrem caminhando na orla da praia da cidade do Rio de Janeiro por estarem, em tese, violando a quarentena, pois não há critério legal ou administrativo federal para qualificá-las como suspeitas ou, alternativamente, prova de que estejam contaminadas e, portanto, devam ser submetidas a isolamento. A rigor, a falta de recursos públicos para realização de testes em massa na população brasileira, o que permitiria separar pessoas contaminadas daquelas outras não contaminadas, levou à opção mais simples para minimizar o contágio, a decretação quarentena sob ameaça de sanção penal.Contudo, paradoxalmente, estão sendo realizados expressivos gastos com hospitais de campanha e outros equipamentos destinados ao atendimento de potenciais vítimas da Covid-19.[54][55]

Não há dúvidas que uma campanha de conscientização sobre os riscos de contágio da doença e a necessidade de redução da circulação social parecem, ao menos neste momento, medidas adequadas. Contudo, parece ser altamente discutível, sob a perspectiva das normas vigentes, a opção de submeter a todos, e não apenas as pessoas suspeitas de estarem contaminadas, a tal medida restritiva sob ameaça de sanção penal.

A questão de fundo é saber se tal opção se revelou legítima. Com as devidas vênias daqueles que entendem em contrário, as quarentenas decretadas parecem extrapolar os limites da lei e do decreto que incorporou o Regulamento Sanitário Internacional da OMS ao ordenamento brasileiro. A lacônica regulamentação da portaria, que não indica critérios para identificação de pessoas suspeitas, o que poderia ser feito indicando pessoas (viajantes em regresso de regiões com casos comprovados de Covid-19, v.g.) acabou por permitir uma ampla regulamentação penal no âmbito Estadual e Municipal. É possível que o Município “A” proíba seus habitantes de saírem de casa, outro que proíba de saírem sem máscaras, outro, ainda, a circulação de veículos particulares.

Todas essas medidas, caso violadas, dariam ensejo a uma possível incidência no dispositivo penal em comento.

Deste modo, tendo em vista todo esse conjunto de normas que incidem sobre o caso concreto, respeitadas as posições em contrário, o tipo parece só se aperfeiçoar na hipótese de violação ao isolamento por parte de pessoa contaminada, como nos exemplos lançados no tópico anterior. Por outro lado, o absoluto descompasso entre regulamentações, de um lado a Lei e o Regulamento Sanitário Internacional, e de outro a Portaria Ministerial, que autorizou a decretação das quarentenas, parece comprometer a legitimidade do complemento que ficou ao arbítrio do mandatário estadual ou municipal. Assim, hipoteticamente, caso reputada válida a decretação da quarentena pelo prefeito de determinado município e estabelecida a obrigatoriedade de uso de máscaras de proteção para a circulação, sob o ponto de vista da interpretação a ser conduzida, em tese, o sujeito que circula sem máscara poderia ser preso por violar a norma municipal relativa à quarentena. De outra banda, a adoção de outro tipo de quarentena em município vizinho já não importará na incriminação de tal conduta, embora a pandemia seja a mesma e de caráter nacional. Com as devidas vênias, o Direito Penal não suporta tamanha quebra da isonomia diante de situações senão idênticas, mas ao menos similares.

Caso tais mandatários providenciem a testagem da população ou, alternativamente, o Ministro da Saúde edite uma nova portaria indicando as pessoas suspeitas, a quarentena decretada a partir desses termos - que são, inclusive, os da OMS -, poderia provocar a incidência típica para o agente que a violar.

Registre-se mais uma vez que não se está a discutir medidas educativas ou de orientação sanitária por parte das autoridades federal, estadual e municipal no sentido de se restringir a circulação das pessoas, mas tão somente os estreitos limites dentro dos quais o Direito Penal pode incidir no contexto em que lhe permitem a Lei e a Constituição.

4. Conclusão

Diante do quadro posto é preciso ter em conta que é legítimo o manejo do Direito Penal com vistas à contenção da epidemia. A falta de recursos remete à adoção de medidas sanitárias mais drásticas para as quais o Direito Penal surge como instrumento de reforço à sua observância.

Não obstante a legitimidade do manejo do Direito Penal, soa a todo evidente que os limites dentro dos quais seria possível adotar medidas restritivas são aqueles entabulados na Lei n. 13.979/2020, no Decreto 10.212/2020 (Regulamento Sanitário Internacional) que fixam os destinatários das medidas de isolamento e quarentena. Outrossim, ao cumprira delegação feita pelo legislador, ao que parece, o Ministro da Saúde, por meio da Portaria 356/2020, furtou-se em delinear com precisão quem seriam as pessoas suspeitas, aquelas que poderiam ser destinatárias das medidas sanitárias restritivas. E assim procedendo abriu espaço para uma ampla regulamentação por Estados e Municípios para definição da medida de quarentena, o que tem refletido na distinta abordagem dada pelos chefes do Poder Executivo de tais entes às limitações de circulação e de realização de atividades econômicas.

Falta, ao que parece, na Portaria 356/2020, uma indicação dos critérios para identificação de pessoas suspeitas e, com isso, embora possam no âmbito de suas respectivas administrações e competências criar obstáculos à liberdade, não podem tais mandatários complementarem norma que não foi parametrizada. Nada impediria, e é bom registrar, que o Ministro da Saúde estabelecesse no ato administrativo que, diante da circulação comunitária do vírus e da impossibilidade de identificar e isolar contaminados, pois, como se sabe, faltam recursos para testar toda a população, que todos fossem considerados suspeitos. Entretanto não o fez e, assim sendo, as normas complementares que fixam a quarentena extrapolaram os limites legalmente impostos sendo, portanto, imprestáveis à concretização do tipo penal.

Contudo, quanto à medida de isolamento imposta por determinação médica, em se tratando de medida de caráter compulsório, a violação da determinação é suficiente a caracterizar o delito. Em momentos extremos como o presente é preciso de mais saúde pública e educação do que de sanções penais. Permanecer em casa é um ato de solidariedade que traduz nossa compreensão enquanto ser social transcendo o individualismo hoje reinante. O estímulo a tais medidas há de ser feito por meio da sensibilização social e não por meio do sancionamento de condutas que, salvo melhor juízo, parecem carecer de legitimidade na incriminação como exposto.

--------------------------------------- 

* José Maria Panoeiro é Mestre e Doutor em Direito Penal (UERJ), Professor de Direito Penal da EMERJ e da ESMPU, Membro do Ministério Público Federal, Pesquisador do Centro de Pesquisas em Crimes Empresariais e Compliance Prof. João Marcelo de Araújo Jr (CPJM-UERJ).

** Elisa Ramos Pittaro Neves é Mestre em Direito Penal (UERJ), Professora de Direito Penal e Processo Penal da EMERJ, Membro do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.

[1]Disponível em: «https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2020-01/oms-declara-estado-de-emergencia-global-em-razao-do-coronavirus» Acesso em 15/04/2020. 
[2]Disponível em: «https://www.unasus.gov.br/noticia/organizacao-mundial-de-saude-declara-pandemia-de-coronavirus» Acesso em 15/04/2020.
[3] FIORAVANTI, Carlos. Semelhanças entre a gripe espanhola e a Covid-19: Pandemia do início do século XX e a atual levaram à valorização do sistema público de saúde. Disponível em: «https://revistapesquisa.fapesp.br/2020/03/26/semelhancas-entre-a-gripe-espanhola-e-a-covid-19/» Acesso em 15/04/2020.
[4] Disponível em: « https://pfarma.com.br/noticia-setor-farmaceutico/estudo-e-pesquisa/5292-hidroxicloroquina-coronavirus.html» Acesso em 15/04/2020.
[5] “[O] cloridrato de quinina, que, durante muitas décadas, foi o principal fármaco usado no combate aos sintomas da malária. A quinina é um alcalóide com propriedades antitérmicas, antimaláricas e analgésicas. A substância, extraída da casca de uma planta sul-americana conhecida como Quina ou Chinchona, permitiu, desde meados do século XIX, o desenvolvimento de uma terapia mais precisa no tratamento da doença. Por muito tempo, a quinina permaneceu como única droga utilizada nos doentes de malária. Mas, durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), devido às dificuldades de acesso à matéria-prima, começaram a ser feitos testes com novas drogas para serem usadas como antiamarílicas, que culminaram em fármacos sintéticos. Os medicamentos sintéticos levaram à diminuição do uso da quinina, porém nenhuma outra combinação de drogas é tão eficaz como ela. Até hoje, ela é a única droga disponível no combate à doença em algumas partes do mundo. O Instituto Oswaldo Cruz, em seus primeiros tempos, destacou-se com a produção do cloridrato de quinina. Em 1918, durante a gestão de Carlos Chagas, que vigorou de 1917 a 1934, inspirado em um programa de medicamentos de sucesso na Europa, criou-se na instituição o Serviço de Medicamentos Oficiais, encarregado da fabricação desse medicamento.” (Disponível em: «https://www.museudavida.fiocruz.br/index.php/museologico/objeto-em-foco/objeto-em-foco-cloridrato-de-quinina» Acesso em 15/04/2020).
[6] Disponível em: «https://titividal.com.br/a-historica-cinchona-officinalis-china/» Acesso em 15/04/2020.
[7] BOULOS, Marcos; DUTRA, Araripe Pacheco; DISANTI, Silvia Maria; SHIROMA, Mário e AMATO NETO, Vicente. AVALIAÇÃO CLÍNICA DO QUININO PARA O TRATAMENTO DE MALÁRIA POR PLASMODIUM FALCIPARUM . Rev. Soc. Bras. Med. Trop. v.30 n.3 Uberaba maio/jun. 1997. Disponível em: «https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0037-86821997000300007» Acesso em 15/04/2020
[8] UBEL, Peter A. A loucura do livre mercado: Por que a natureza humana vai contra a economia – e por que isso importa; tradução de Rodrigo Lopes Sardenberg. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 2014, p. 27-45.
[9] BORGES, Anselmo. O Crime Econômico na Perspectiva Filosófico-Teológica, in: Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 10, fasc. 1, jan-mar, 2000, p. 11.
[10] Neste sentido: GRACIA MARTÍN, Luis. El derecho penal ante laglobalización económica. In: SERRANO-PIEDECASAS, José Ramon; DEMETRIO CRESPO, Eduardo. El derecho penal económico y empresarial ante los desafios de la sociedade mundial delriesgo. Madrid: Colex, 2010, p. 68.
[11]GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988, 12ª edição. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 225-227.
[12] RODRIGUES, Anabela Miranda. Direito Penal Económico: Uma política criminal na era compliance. Coimbra: Edições Almedina, 2019, p. 13.
[13] SARS é a sigla em inglês para SevereAcuteRespiratorySyndromeou Síndrome Respiratória Aguda Grave.
[14] Disponível em: «https://www.who.int/csr/sars/en/ea56r29.pdf?ua=1» Acesso em 15/04/2020.
[15] CARPIO BRIZ, David. Concepto y contexto delderecho penal económico. In: CORCOY BIDASOLO, Mirentxu; GÓMEZ MARTÍN, VÍCTOR (Dir.); MIR PUIG, Santiago ... [el al.] (Aut.); DÍAZ MORGADO, Celia. MANUAL DE DERECHO PENAL, ECONÓMICO Y DE EMPRESA: PARTE GENERAL Y PARTE ESPECIAL (Adaptado a las LLOO 1/2015 y 2/2015 de Reforma del Código Penal) Doctrina y jurisprudenciacon casos solucionados, TOMO 2. Valencia: TirantloBlanch, 2016, p. 18.
[16]“Enquanto médicos, cientistas e pesquisadores não encontram um tratamento eficaz, quiçá uma vacina profilática que possa afastar, de vez, os perigos do assim chamado SARS-CoV2, a providência a sanitária de rigor, além da higienização, é evitar a circulação e a aglomeração de pessoas. Numa palavra, isolamento e quarentena. Nesse sentido, a Lei n. 13.979/2020, anteriormente citada, dispõe que as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, dentre outras, as seguintes ações: 1) isolamento; 2) quarentena; e 3) impedimento de entrada no País”. (SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ, Carlos Eduardo. O novo coronavírus e o Direito Penal. Disponível em: https://genjuridico.com.br/2020/04/06/novo-coronavirus-crime-de-epidemia/Acesso em: 15/04/2020).
[17] [...] Portanto, o caso é de se afastar, nesta análise perfunctória, a incognoscibilidade do pedido. O juízo definitivo sobre o cabimento da impetração deverá ser colegiado, após a instrução do feito com as informações do Governador João Dória e do parecer ministerial.
Todavia, não está configurado um dos pressupostos autorizadores do acolhimento da pretensão liminar, qual seja, o fumus boni iuris, pois a plausibilidade do direito invocado pela Parte impetrante não é de reconhecimento que se mostra prontamente inequívoco.
Conforme decidiu, ad referendum do Plenário do Supremo Tribunal Federal, o Ministro ALEXANDRE DE MORAES, os governadores e prefeitos têm plena legitimidade para adotarem medidas como "imposição de distanciamento/isolamento social, quarentena, suspensão de atividades de ensino, restrições de comércio, atividades culturais e à circulação de pessoas" (ADPF 672/DF-MC, DJe de 14/04/2020), derivadas da competência constitucional que lhes permite implementar políticas públicas para o combate da pandemia de Covid-19. Ante o exposto, INDEFIRO o pedido liminar. [...] (STJ: HC 573208/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, decisão monocrática em 17/04/2020).
[18] HUNGRIA, Nelson. Comentários ao Código Penal, Vol. IX, Arts. 250 ao 361. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1958, p .7.
[19] SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ, Carlos Eduardo, op.cit. nota 12.
[20] HUNGRIA, Nelson, op.cit. p. 8.
[21] BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Crimes de perigo abstrato e princípio da precaução na sociedade de risco. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 61.
[22] MUÑOZ CONDE, Francisco. Derecho Penal: Parte Especial, 18ª edición. Valencia: Tirant to blanch, 2010, p. 647.
[23] MUÑOZ CONDE, Francisco, op.cit., p. 646.
[24] HUNGRIA, Nelson, op. cit., p. 96.
[25] No mesmo sentido que frente ao conceito de saúde individual, a noção de saúde pública sublinha a dimensão social do bem jurídico: MUÑOZ CONDE, Francisco, op.cit., p. 647.
[26] GÓMEZ INIESTA, Diego J. La protección penal de los medicamentos y productos sanitários. In: In: CORCOY BIDASOLO, Mirentxu; GÓMEZ MARTÍN, VÍCTOR (Dir.); MIR PUIG, Santiago ... [el al.] (Aut.); DÍAZ MORGADO, Celia. MANUAL DE DERECHO PENAL, ECONÓMICO Y DE EMPRESA: PARTE GENERAL Y PARTE ESPECIAL (Adaptado a las LLOO 1/2015 y 2/2015 de Reforma del Código Penal) Doctrina y jurisprudenciacon casos solucionados, TOMO 2. Valencia: TirantloBlanch, 2016, p. 307-331.[27]“Artículo 43: 1. Se reconoce el derecho a laprotección de lasalud. 2. Compete a los poderes públicos organizar y tutelar lasalud pública a través de medidas preventivas y de las prestaciones y serviciosnecesarios. La leyestablecerálosderechos y deberes de todos al respecto. 3. Los poderes públicos fomentaránlaeducaciónsanitaria, laeducación física y el deporte. Asimismofacilitaránlaadecuadautilizacióndelocio. (Tradução livre: Artigo 43: 1. O direito à proteção da saúde é reconhecido. 2. Cabe aos poderes públicos organizar e proteger a saúde pública através de medidas preventivas e dos benefícios e serviços necessários. A lei estabelecerá os direitos e deveres de todos a esse respeito. 3. Os poderes públicos promoverão educação em saúde, educação física e esporte. Também facilitarão o uso adequado do lazer.)
[28]Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
[29] GÓMEZ INIESTA, Diego J., op.cit., p. 331.
[30]Os entes da Federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde e, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. (STF, RE 855.178-ED, rel. p/ o ac. min. Edson Fachin, DJE 16/04/2020)
[31] HUNGRIA, Nelson, op.cit., p. 101.
[32] Utiliza-se do termo epidemia para manter uma conexão lógica com o tipo penal antecedente, o art. 267, que trata do delito de epidemia, embora não se ignore a distinção entre pandemia, epidemia e endemia. Neste sentido: NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 17ª. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 764.
[33] SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ, Carlos Eduardo, op.cit. nota 12.
[34] MUÑOZ CONDE, Francisco, op.cit., p. 647.
[35] SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ, Carlos Eduardo, op.cit. nota 12.
[36] HUNGRIA, Nelson, op.cit., p. 101.
[37]SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Curso de Direito Penal – Parte Geral. 2.ed.Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 110-113.
[38] HUNGRIA, Nelson, op.cit., p. 101.
[39] SOUZA, Artur de Brito Gueiros; JAPIASSÚ, Carlos Eduardo, op.cit. nota 12.
[40] HUNGRIA, Nelson, op.cit., p. 101.
[41] HUNGRIA, Nelson, op.cit., p. 101-102.
[42] Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
[...] II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
XII - previdência social, proteção e defesa da saúde;
 Art. 30. Compete aos Municípios:
II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
[43] Disponível em: «https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5880765» Acesso em 18/04/2020.
[44] Disponível em: «https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15342859232&ext=.pdf» Acesso em 18/04/2020.
[45]Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;
III - participação da comunidade.
[46] Disponível em: «https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15342859232&ext=.pdf» Acesso em 18/04/2020.
[47]Disponível em: «https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15342859232&ext=.pdf» Acesso em 18/04/2020.[48]MACHADO, João Baptista. Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador. Coimbra: Edições Almedina SA, p. 59-63.[49]Disponível em: «https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15342859232&ext=.pdf» Acesso em 18/04/2020.[50]Art. 3º A ESPIN será declarada em virtude da ocorrência das seguintes situações:
I - epidemiológicas;
II - de desastres; ou
III - de desassistência à população.
§ 1º Consideram-se situações epidemiológicas, para os fins de aplicação do inciso I do caput, os surtos ou epidemias que:
I - apresentem risco de disseminação nacional;
II - sejam produzidos por agentes infecciosos inesperados;
III - representem a reintrodução de doença erradicada;
IV - apresentem gravidade elevada; ou
V - extrapolem a capacidade de resposta da direção estadual do Sistema Único de Saúde - SUS. (Disponível em: «https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Decreto/D7616.htm» Acesso em 18/04/2020).
[51] Disponível em: «https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-188-de-3-de-fevereiro-de-2020-241408388» Acesso em 18/04/2020.
[52] HUNGRIA, Nelson, op.cit., p. 101.
[53] Fonte: «https://g1.globo.com/sp/vale-do-paraiba-regiao/noticia/2020/04/07/dois-surfistas-sao-detidos-em-praia-por-descumprir-quarentena-em-ubatuba-sp.ghtml» Acesso em 19/04/2020.
[54] Fonte: «https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2020/04/10/governo-do-rj-gasta-r-1-bilhao-em-contratos-sem-licitacao-para-combate-a-covid-19.ghtml» Acesso em 20/04/2020.
[55] Fonte: «https://www.folha1.com.br/_conteudo/2020/04/geral/1260532-hospital-de-campanha-envolvida-em-denuncia-de-superfaturamento.html» Acesso em 20/04/2020.

--------------------------------------- 
***O conteúdo publicado é de inteira responsabilidade do(s) autor(es) e não expressa o pensamento institucional da ESMPU.