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Direitos indígenas: último painel trata de práticas do trabalho indígena
O último painel fechou o evento com debates sobre trabalho indígena e tráfico de pessoas.
O último painel do Simpósio “Desafios e perspectivas sobre temas atuais dos direitos indígenas no Brasil”, na noite de sexta-feira (13/04), fechou o evento com debates sobre trabalho indígena e tráfico de pessoas. O subprocurador-geral da República e integrante da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, Rogério de Paiva Navarro, mediou os debates.
O diretor-geral da Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU), João Akira Omoto, fez um balanço das atividades ressaltando a necessidade de dar voz àqueles que não têm lugar. “A proposta do Simpósio foi a de enxergar o indivíduo, o homem, o sujeito de direitos e tirá-los da condição de objetos em que nós historicamente os colocamos”, afirmou.
Questões lançadas pela procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, mostraram à plateia que, ao tratar da temática indígena, não há respostas simples. “É trabalho infantil a criança indígena que sai para pescar com o pai? E se for uma atividade econômica, com o objetivo de servir aos integrantes da comunidade?” A procuradora lembrou que, muitas vezes, o processo de aprendizagem de jovens indígenas pode ser desenvolvido em contextos diferentes do ensino formal e pelos modos tradicionais de transmissão.
O olhar para as diferenças, respeitando-se as histórias, particularidades, opinião e vontades dos povos, foi a premissa lançada pela oficial técnica em Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Thaís Dumêt Faria. Para ela, a Convenção 169 da OIT trouxe o mecanismo de consulta como eixo central. A oficial técnica lembrou que as decisões devem ser tomadas com base nas especificidades de cada povo.
Ao falar sobre exploração do trabalho indígena infantil, a pesquisadora demonstrou os prejuízos que essa prática causa à continuidade das tradições. Segundo a pesquisadora, quando a criança indígena sai de sua comunidade para trabalhar segundo a lógica exploratória, ela não está em contato com seu idioma, costumes, religiosidade, valores. “Como ela vai voltar e preservar a cultura se ela não estava ali nos momentos de colheita e com os familiares de seu grupo?”, indagou. Concluiu que as ameaças do trabalho infantil indígena atingem a própria criança e também a garantia de continuidade das tradições de um povo.
Dumêt mostrou o caso dos indígenas da aldeia Cachoeirinha, em Miranda-MS, na colheita da maçã, quando os trabalhadores indígenas enviaram uma reinvindicação para as empresas que os fossem contratar. “Não é nada além do que qualquer outro trabalhador teria direito. A única coisa distinta de outra organização de trabalhadores é a proibição de venda de bebida alcoólica, por ser uma questão cultural”. Ela ainda ressaltou que a contratação regular de indígenas para o trabalho deve se dar por meio da escuta. “O empregador deve ter a sensibilidade de entender as necessidades daqueles trabalhadores para a manutenção cultural de seu grupo”.
O subprocurador-geral do Trabalho Luís Antônio Camargo de Melo falou sobre sua experiência de enfrentamento de questões com trabalhadores indígenas nas destilarias de açúcar e álcool em Mato Grosso do Sul, na década de 1990. Na época, pelo menos 8 mil trabalhadores indígenas foram recrutados sem regularização. Ele explicou que os trabalhadores eram levados das aldeias para o corte de cana sem nenhum tipo de regularização – não havia pagamento de férias, décimo terceiro salário, recolhimento de INSS ou FGTS. A situação se manteve por anos, segundo o subprocurador, com a conivência da sociedade, de empresários e da Fundação Nacional do Índio (Funai).
Camargo de Melo destacou a dificuldade de regularização nas mesas de conciliação. Ele contou que os empresários pagavam uma taxa comunitária às lideranças indígenas e ameaçavam suspender o pagamento caso houvesse a regularização de trabalhadores. Foram ajuizadas ações civis públicas para cada destilaria, com ganho de causa em primeira instância em boa parte dos processos. O painelista lembrou que a legislação trabalhista veda a discriminação de trabalhadores.
Uma das soluções encontradas pelo Ministério Público do Trabalho foi a utilização da ferramenta do contrato de equipe. Esse contrato estabelecia um período menor para evitar a ausência da aldeia de trabalhadores por longos períodos. Esse modelo também permitia a manutenção de um grupo coeso, com responsabilidades partilhadas entre os integrantes da etnia (havia trabalhadores responsáveis pelo corte, pela alimentação e pelos cuidados com os alojamentos).
Tráfico de pessoas – Um olhar diferente para as particularidades dos povos indígenas foi também a tônica da manifestação da antropóloga Marcia Anita Sprandel, integrante do Comitê de Migrações e Deslocamentos da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e assessora técnica no Senado Federal. Ao falar sobre o combate ao tráfico de pessoas, ela citou que, no relatório do CIMI de 2016 – “Violência contra os povos indígenas do Brasil”, não há menção ao tráfico de pessoas. Ela ressaltou que a legislação antitráfico (normas tradicionalmente aplicadas a contextos urbanos) deve prever a circulação de populações indígenas em regiões fronteiriças. “Assim como trabalhadores não indígenas, essas populações são potenciais vítimas desse tipo de crime”, concluiu.
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